quinta-feira, 6 de junho de 2013

HISTÓRIA DO RIO GRANDE DO NORTE
Prof. Rônnik

A Capitania do Rio Grande

Capitanias hereditárias
Após três décadas da descoberta do que seria posteriormente chamado de Brasil, Portugal voltou-se para a sua ocupação e conquista, muito mais por medo de perdê-la do que por convicção de ser um bom empreendimento.
O modelo de colonização escolhido foi o de Capitanias Hereditárias, já implantado com relativo sucesso em algumas de suas possessões menores no Atlântico, próximo ao continente africano. A Colônia, então denominada de Santa Cruz, foi dividida em quinze lotes, distribuídos entre doze donatários. A concessão dava-se por meio da Carta de Doação, na qual eram definidos os limites físicos da capitania, e do Foral, no qual eram estabelecidos os direitos e deveres dos beneficiários.
A Capitania do Rio Grande
A Capitania do Rio Grande, com cem léguas, foi doada a João de Barros, feitor das Casas de Mina e da Índia, a qual foi aglutinada com cinqüenta léguas doadas a Aires da Cunha e setenta e cinco léguas doadas a Fernão Álvares de Andrade, perfazendo um total de duzentos e vinte e cinco léguas de terras, cujos limites não são muito claros, em função do desaparecimento da Carta de Doação (CASCUDO, 1984).



O fracasso das primeira tentativas
A conquista do Rio Grande não foi possível por seus donatários em virtude da bravura dos índios Potiguares e dos franceses, esses últimos aqui embrenhados, fazendo exploração clandestina. Duas tentativas de conquista foram feitas pelos seus donatários, sendo a primeira em 1535, comandada por Aires da Cunha, contando com as presenças dos filhos de João de Barros (João e Jerônimo de Barros) e um representante de Fernão Álvares e mais novecentos homens e cem cavalos, armas e munições do próprio arsenal régio, e a segunda, provavelmente em 1555, tendo à frente somente os filhos de João de Barros. As duas tentativas fracassaram e o máximo que conseguiram foi fundar um povoado na ilha do Maranhão, a que deram o nome de "Nazaré", isso durante a primeira tentativa.
A conquista definitiva
Devido a sua localização e a sua extraordinária importância para a conquista do Norte, o Rei retomou a possessão do Rio Grande mediante indenização à família de João de Barros e ordenou ao sétimo Governador Geral do Brasil (l591 - 1602) Dom Francisco de Souza, que providenciasse a expulsão dos franceses e a construção de um Forte para dar início à colonização da Capitania. O trabalho de atacar os franceses e os índios revoltosos coube, por ordem de D. Francisco de Souza, aos capitães-mores de Pernambuco e da Paraíba, Manuel de Mascarenhas Homem e Feliciano Coelho de Carvalho, respectivamente.
A vitória portuguesa
De acordo com a organização estratégica para o ataque, duas frentes foram formadas, sendo que uma avançou por mar, comandada por Mascarenhas Homem e a outra por terra, capitaneada por Feliciano Coelho. O empreendimento foi coroado com êxito e em 06 de janeiro de 1598 foi iniciada a construção do Forte dos Reis Magos, sob os cuidados do jesuíta Gaspar de Samperes e planta de sua autoria. Daí surgiu um povoado que deu origem a Natal e também a base para a conquista da região setentrional brasileira, como um todo.
Sociedade colonial
A sociedade norte-rio-grandense após a conquista pelos portugueses era composta basicamente por três grupos étnicos: os aborígenes servindo como escravos, aldeados ou revoltados, embrenhados no mato, os invasores brancos divididos em homens livres proprietários e homens livres não proprietários e os escravos negros oriundos da África. E por imposição da própria conquista era uma sociedade agrária, na qual, em torno dos homens livres proprietários, gravitavam todas as determinações do local.
Primeira atividades econômicas coloniais
As primeiras atividades econômicas da capitania são marcadamente de subsistência, ancorando-se na pecuária, na pesca e na agricultura de mantimentos. A cultura da cana-de-açúcar nunca obteve tanto avanço aqui, restringindo-se, à época dos primeiros tempos, apenas ao vale do Cunhaú e posteriormente espalhando-se por todo o litoral sul da capitania.
Paralelamente à exploração dessas atividades, fazia-se a exploração do pau-brasil, com encaminhamento direcionado à Coroa.
Em que pese a importância do pau-brasil, da cana-de-açúcar, da pesca, da agricultura etc., a atividade econômica que viabilizou a ocupação definitiva da Capitania do Rio Grande (do Norte) foi a pecuária. De modo que a esta atividade deve-se não só a ocupação mas sobretudo o seu desenvolvimento.
Os Potiguares
A descoberta de um novo mundo proporcionava enfrentar barreiras, vencer desafios, rumar ao desconhecido. Terra... terra farta, terra de ninguém pronta para ser desbravada, conquistada e explorada.
Mas que surpresa! Os portugueses, aqui chegando depararam-se com criaturas "de porte mediano, acima de 1,65cm, reforçados e bem feitos no físico. Olhos pequenos e amendoados como os da raça mongólica, escuros e encovados, de orelhas grandes, cabelos lisos e cortados redondos, arrancavam os pêlos da barba até as pestanas e sobrancelhas. Eram baços, claros, pintavam seus corpos com desenhos coloridos. Furavam o beiço, principalmente o inferior, assim como orelhas e o nariz". (SUASSUNA & MARIZ: 1997, p. 51).
Seus corpos nus expostos ao sol, sob o calor e maresia, demonstravam íntimo contato com a natureza selvagem e hostil. Contrastando com as cores do horizonte e na beleza exótica do lugar, os nativos observavam grandes embarcações com figuras espalhafatosas se aproximarem.
Nesse primeiro contato, os portugueses encontraram um povo que, na escala evolutiva, superava o paleolítico e dava seus primeiros passos na revolução agrícola, quanto à domesticação de plantas de condições selvagens para mantimento de seus roçados, assim como o cultivo da mandioca. Também foram cultivadas outras espécies, como: milho, batata-doce, abóbora, algodão, tabaco, cuias e cabaças, e algumas árvores frutíferas. Para seu cultivo empregavam técnicas e instrumentos rudimentares, como a queimada e a derrubada de árvores com machados de pedra.
Além da agricultura, os indígenas praticavam a caça e a pesca como fonte de alimentação, empregando armas como o arco e flecha com pontas talhadas em pedra. Da mesma forma que eram usados na guerra.
Os homens nativos integravam-se perfeitamente ao meio, mas eram agressivos quanto a outros grupos e viviam em constantes lutas por seu território e lugares sagrados, defendendo sua aldeia.
Festejaram a natureza, as estações, as luas, o sol, a chuva. Dançavam, cantavam em noites de festas, adornados com belas plumagens, em cocares, braceletes e tornozeleiras. Ficando em volta de grandes fogueiras, cultuavam seus mortos, valentes e valorosos guerreiros pedindo sua proteção, junto aos deuses.
Enquanto que os inimigos vencidos e aprisionados eram sacrificados em rituais de antropofagia.
Na cura de doenças, utilizavam de ervas e raízes extraídas da própria natureza. Assim como o uso de entorpecentes pelo Xamãs e Pajés, quando evocavam os deuses para auxiliá-los na luta contra os espíritos do mal.
Falavam o nhe-ê-Katu (língua boa), diferenciando de outros dialetos existentes nas diferentes tribos.
Utilizavam a cerâmica na fabricação de utensílios domésticos. A rede servia para o descanso e a canoa para locomoção e pesca.
Sob o olhar europeu, aqueles nativos selvagens precisavam aprender normas de conduta e suas almas necessitavam de salvação para poderem integrar-se a uma civilização. Civilização essa que desprezara sua cultura, crenças, tradições interferindo no curso de suas vidas cotidianas.
Foi de relevante importância a missão dos padres junto aos indígenas quanto à catequização, resultando em acordos de paz, ansiados por ambas as partes.
Nesta jornada destaca-se a figura de Francisco Pinto, "apóstolo da paz", que através da catequese conseguia levar os nativos para o lado dos portugueses. Assistindo-os em suas necessidades.
Entre os nativos, Felipe Camarão revela-se como grande aliado dos portugueses, juntamente com seus comandados, destacando-se na luta contra os holandeses e seus aliados.
A participação dos potiguares também é registrada na guerra dos bárbaros ou Confederação dos Cariris, em que se rivalizavam com os Tapuias. Pois não era possível essa homogeneidade entre tribos de diferentes línguas e costumes.
As rivalidades existentes entre tribos, o domínio português e a presença de negros, contribuiu para que houvesse sincretismo de culturas, onde o índio perdeu seu espaço e território. Com isso, sua história é de difícil acesso, ficando diversas indagações sobre origens e evolução cultural, pois a presença do português e da catequização contribuíram para um direcionamento na visão histórica, a partir do momento que sentiram necessidade de integrá-los ou combatê-los, de acordo com seus interesses.
Entre os nativos, Felipe Camarão revela-se como grande aliado dos portugueses, juntamente com seus comandados, destacando-se na luta contra os holandeses e seus aliados.
A participação dos potiguares também é registrada na guerra dos bárbaros ou Confederação dos Cariris, em que se rivalizavam com os Tapuias. Pois não era possível essa homogeneidade entre tribos de diferentes línguas e costumes.
As rivalidades existentes entre tribos, o domínio português e a presença de negros, contribuiu para que houvesse sincretismo de culturas, onde o índio perdeu seu espaço e território. Com isso, sua história é de difícil acesso, ficando diversas indagações sobre origens e evolução cultural, pois a presença do português e da catequização contribuíram para um direcionamento na visão histórica, a partir do momento que sentiram necessidade de integrá-los ou combatê-los, de acordo com seus interesses.
de vida. Quando isso acontecia eram homenageados por sua tribo. Isto quando do sexo masculino - se do sexo feminino, ao darem à luz a mais de um filho, tornavam-se cativas. Estando doentes são visitados pelos amigos e se o caso de morte, matavam-nos para que não houvesse sofrimento. A causa mais freqüente de óbito entre os Tapuias era o veneno de cobra. Eram endocanibalistas, devoravam até mesmo os de sua tribo, quando da sua morte.
A Vida Amorosa dos Tapuias
A puberdade era o período em que a donzela estaria pronta para casar-se. A virgindade era bastante valorizada. O namoro, acontecia entre danças, onde eram escolhidos os pretendentes. No noivado, o pretendente oferecia presente ao sogro. Quando a donzela não arrumava pretendente, era levada ao rei e este a possuía.
Os jovens tinham que demonstrar valor pessoal, exibindo força física. O rei aprovava a cerimônia e quando esta se realizava, furavam-se as faces dos noivos e colocavam pauzinhos. A festa durava cinco dias. Os matrimônios eram severos, apesar da poligamia, mas as cerimônias eram reservadas às primeiras esposas. Possuir várias mulheres era sinal de prestígio. O adultério era raro, e o marido expulsava a ré, depois de açoitá-la, no caso do flagrante e poderia matá-los. Sobre os tapuias cariris, eram praticantes do adultério, e era recíproco.
Da Gravidez, do Parto e das Crianças
A Índia, quando grávida, não tinha relações com o marido, também enquanto amamentava. A tapuia dava à luz nas matas, cozia o umbigo e a placenta e comia. Quando voltava ao acampamento, o filho era cuidado por outra mulher. Os maridos tinham o mesmo resguardo da parturiente. Esta se alimentavam de farinha de mandioca, milho, feijão, até o nascimento dos dentes dos lactentes. Os nascidos mortos eram devorados pelos tarairiús. As crianças começavam a andar com nove semanas e aprendiam a nadar nesta mesma época. Entre sete e oito anos eram furados o lábio inferior e as orelhas e colocados ossos e paus, depois eram batizados, ficando aptos para as lutas.
Ferocidades, Armas e Lutas dos Tapuias
Os Tapuias possuíam semblante ameaçador, corriam igual as feras, por isso eram muito temidos. Eram inconstantes, fáceis de ser levados a fazer o mal. Eram fortes, carregavam nos ombros grandes pesos. Ao irem para guerra, marchavam em silêncio, mas no embate faziam bastante alarido, jogando setas envenenadas das quais os feridos jamais escapavam.
Foram úteis, como aliados dos holandeses, conduzindo aos lugares mais difíceis. Os tapuias que se destacavam nas lutas eram considerados heróis.
O poder real não era hereditário, este era substituído quando morto. O rei distinguia-se dos outros pelos cabelos e pelas unhas. Os tapuias eram muito obedientes ao rei.
Os tapuias se enfeitavam da cabeça aos pés para as lutas. Suas armas eram as flechas, as pranchetas, arcos e dardos, que usavam com grande habilidade. Usavam também as clavas e machados de mão; as armas eram enfeitadas com bonitas plumas. Eles não se utilizavam das armas de fogo, passaram a usar em razão da Guerra dos Bárbaros.
Das Habitações dos Tapuias
Eram nômades, paravam onde houvesse abundância de alimentos. Gostavam de viver ao ar livre. Por isso não construíam casa, levantavam alguns ramos para servir de abrigo. Eram gulosos, as reservas alimentares dentro da área duravam somente dois ou três dias. Quando partem para outros sítios tocam fogo no acampamento.
O rei era quem programava as atividades do dia e da noite. Antes de partirem, banhavam-se no rio, para espantar a moleza. Quando mudavam de acampamento, os mais fortes carregavam dois troncos de árvores. As mulheres e os meninos conduziam as armas, as bagagens e os trastes. Chegados ao local do novo acampamento, iam cortar árvores, e usavam os galhos e ramagens para fazerem sombra. As habitações dos tapuias eram toscas e feias.
Caça, Pesca e Agricultura dos Tapuias
Os tapuias levavam uma vida descuidosa. Não semeavam, não plantavam, nem se esforçavam por coisa alguma. Alimentavam-se com mel de abelhas e maribondos e com todas as imundícies da terra, como cobras e lagartos. Os tapuias armavam ciladas aos peixes e animais, utilizando seu admirável olfato e sua habilidade para comer. Alimentavam-se ainda de frutos agrestes, caça fresca, peixes, tudo sem temperos ou condimentos. Não
semeavam outra coisa além da mandioca.
Para assar a carne, eles cavavam um buraco na terra e colocavam a carne, depois enterravam pondo folhas de árvores por cima e faziam uma fogueira por cima de tudo.
Para atraírem felicidade na caça e pesca, os tapuias cariris queimavam ossos de animais ou espinhas de peixes.
Os Jovens caçadores presenteavam os velhos da tribo com caças e pescarias, sem sequer comer um único pedaço. Durante o período de caça e pesca, comiam uma sopa muito rala, feita com farinha de milho ou mandioca. Depois dessa temporada, estavam magros, por razão do intenso trabalho e da alimentação inadequada.
A Língua dos Tapuias
A linguagem era um tanto mal entendida, pois era trêmula, e cantada, não se entendia nada.
Dezenas de palavras foram usadas na linguagem dos tapuias como por exemplo; carfa, caruatá, cayú, comatyn, corpamba, corraveara, cucuraí, ditre, entre outros.
As Aldeias Indígenas
Foram aldeias, que em pouco tempo foram transformadas em vilas, onde existia um chefe para governar esse vilarejo indígena, onde estabeleceu-se a forma de vida um tanto democrática entre os demais. Podemos citar alguns nomes de aldeias existentes, como: a aldeia Jacoca, Utinga, Baía da traíção, Monte Mor da preguiça, Boa Vista, Cariris, Campina Grande, Brejo, Panatis, Coremas, Aldeia dos Pegas, dos Icos pequenos, etc.
Religião dos Tapuias
A religião dos Tapuias era basicamente animista, eles adoravam as forças da natureza com o trovão, a lua, o sol, além disto, acreditavam que certos animais, como serpentes, aves e alguns mamíferos, como morcegos, praticaram sacrifícios de animais, até humanos. Os europeus aqui chegados trataram de demonizar os deuses dos Tapuias, como podemos ver na frase do cronista Morisot, "Os brasilianos só adoram o diabo, não que daí esperem um bem, mas porque o temem, e por esse motivo oferecem sacrifícios e o invocam". (30, 125).
Os Tapuias também tinham como Deus principal a Constelação da Ursa Maior, para eles um inimigo dos Tapuias o intrigou com o seu Deus, este era a raposa, a causadora de sua expulsão do paraíso. Os tapuias acreditavam na imortalidade da alma desde que a pessoa não tivesse morrido de morte matada ou de picada de serpente.
Os Tapuias não faziam nada sem antes consultar os feiticeiros e adivinhos. De um modo geral, a religião dos tapuias lembra um pouco as religiões da África, no tocante a influência forte dos feiticeiros na vida indígena. Os europeus viam nos rituais dos tapuias um comércio direto com os poderes do inferno, além disto os tapuias possuíam deuses também que regiam a agricultura, a pesca e a caça, os invocaram e sacrificaram a eles para obter boas colheitas, pesca e caça fartas. Os tapuias tinham uma lenda que falava no Deus da criação, que tinham dois filhos, o mais novo foi embora para a terra, o Deus pai enviou seu filho mais velho para buscar seu filho mais novo, mas este e seus filhos acabaram maltratando e matando o irmão mais velho, que depois de morto ficou na terra, entre seus parentes, por vários dias e somente depois ascendem ao céu, retornando para o seu pai.
Os europeus acreditavam que o Deus em quem os tapuias falavam era o Deus de Israel, o filho mais velho Jesus Cristo e o filho mais novo seria o próprio Lúcifer ou Caim.
Os franceses na costa potiguar
Oficializado o descobrimento do Brasil, fato consolidado em 1500, pouco foi feito, em termos de colonização, nos primeiros anos do século XVI. Aos portugueses, naquele momento, interessava mais a exploração do Oriente, onde predominava o comércio das especiarias – produtos tão cobiçados na Europa da época. Por essas bandas, de comercializável, predominavam apenas as madeiras tintoriais que, ao que parece, não interessavam muito aos portugueses, naquele instante.
À espreita, rondavam os corsários franceses que, por sua vez, não contando com uma frota marítima capaz de lhes proporcionar grandes conquistas, vão aos poucos adentrando os mares, tendo penetrado na costa potiguar, lá pelos idos de 1535; um feito que enaltecera os franceses, apesar de ter sido um fato ilegal, visto que pelo Tratado de Tordesilhas essas terras pertenciam a coroa de Portugal.
A situação geográfica da região onde hoje se localiza o atual Rio Grande do Norte foi bastante favorável às incursões dos piratas e/ou corsários franceses que logo travaram grande camaradagem com os indígenas da área, tendo estabelecido o comércio e o tráfico do pau-brasil e proporcionado às mestiçagens na área dominada pelos potiguares.
Também por aquela época, a coroa portuguesa instituíra o sistema de capitanias hereditárias, tendo sido concedida a área do Rio Grande ao honrado Feitor da Casa de Mina e da Índia, João de Barros. Com o objetivo de evitar maiores dispêndios na ocupação de seu quinhão, João de Barros associa-se a dois outros donatários, que haviam sido beneficiados com lotes de terras, em regiões a Oeste do Rio Grande. Impossibilitado de participar
da honrosa empreitada de ocupação de sua capitania, devido suas atividades de burocrata, Barros autoriza seus dois filhos, João e Jerônimo, a partirem para a colônia e apossarem-se das terras que, de acordo com o supremo direito concedido por El Rei D. João III, lhes pertenciam.
Ao adentrarem em "terras" potiguares, os arrojados colonizadores portugueses foram recepcionados a flechadas pelos nativos potiguares que, ajudados pelos traficantes franceses, resolveram impedir a posse dos filhos de João de Barros na capitania.
A fácil amizade firmada entre franceses e nativos potiguares deveu-se, em boa parte, ao tipo de interesse econômico, que aqueles tinham para com a terra. Os franceses buscavam apenas o comércio, sobretudo do pau-brasil e para tanto, fazia-se necessário cultivar a amizade dos nativos potiguares, de forma a obterem a mão-de-obra e os produtos desejados, sem terem que enfrentar maiores dificuldades. Ao contrário dos franceses, que desenvolveram vivência comum com os nativos potiguares por vários anos, os portugueses pretendiam fixar-se na terra, vindo a proporcionar mudanças drásticas de costumes, hábitos e crenças, através da imposição de uma nova ordem e disciplina aos indígenas.
O clima de familiaridade firmado entre franceses e potiguares foi fator preponderante para que, durante o século XVI, a área que abrangia a capitania do Rio Grande tenha sido um reduto de traficantes de madeiras tintoriais. Foi somente no final do século mencionado que os portugueses, temerosos de que os franceses viessem a consolidar a dominação da costa potiguar, decidiram-se pela ocupação definitiva da área. O empreendimento final da conquista, por parte dos portugueses, coube ao Governo Geral que, aliado a alguns colonos ricos, esperançosos de dominarem uma nova região aberta ao comércio, partiu para uma ocupação definitiva. Os objetivos iniciais da colonização do território potiguar seriam a construção de uma fortaleza militar e a edificação de uma cidade, que serviria como marcos de dominação.
O domínio do território não foi tarefa fácil, pois os potiguares continuaram hostis em relação aos portugueses, mesmo não contando mais com todo o apoio dos franceses, que ao presenciarem a armada portuguesa, picaram suas amarras deixando para trás uma capitania devastada pela exploração
desenfreada de suas matas. Apesar das freqüentes hostilidades dos nativos, os portugueses consolidaram o domínio definitivo da capitania, fato que se deu nos últimos dias de 1597.
A Fortaleza dos Reis Magos
Para oficializarem definitivamente a conquista e a colonização da Capitania do Rio Grande, os portugueses tiveram que enfrentar a presença francesa nas terras potiguares. Os franceses que já tinham sido expulsos da Paraíba, partido para o Norte e através de alianças com os indígenas potiguares estabeleceram-se na Capitania do Rio Grande, preocupando os portugueses.
Estavam em jogo interesses militares e econômicos, haja visto que a Capitania do Rio Grande encontrava-se num ponto geográfico de grande valor estratégico e possuía uma importante via de acesso – o Rio Grande, Potengy – que permitiria uma melhor penetração dos colonizadores, que poderiam se estabelecer terra a dentro. Por isso, era mister para a Coroa Portuguesa apossar-se de uma vez por todas das terras potiguares, expulsando os franceses.
Para pôr em prática as suas intenções quanto à Capitania do Rio Grande, a Coroa Portuguesa através das Cartas Régias de 9 de novembro de 1596 e de 15 de março de 1597, determinou a expulsão dos franceses do Rio Grande e a fundação de um povoamento naquela região, como também a construção de uma fortaleza na foz do Rio Grande, que seria responsável pela defesa do território.
Fazendo valer o que estabeleciam as Cartas Régias, em dezembro de 1597, chega à foz do Rio Grande, uma expedição formada por Manuel Mascarenhas Homem, Capitão-mor de Pernambuco, Feliciano Coelho, Capitão-mor da Paraíba, Francisco de Barros Rego, Comandante de
Esquadra, os irmãos mestiços Jerônimo, Jorge e Antonio de Albuquerque, os padres Lemos e Gaspar de São João Peres, da Companhia de Jesus e Frei Bernadino das Neves. Essa expedição deu início à conquista e à colonização da Capitania do Rio Grande.
O acampamento da expedição, escreve Paulo Ferreira dos Santos, "ocorreu de forma tranqüila, sem maiores atropelos, apesar do trovejar de cinqüenta mosquetes franceses, protegendo a indiada numerosa que atacava, gritando raivosos, sendo repelidos pelos portugueses que chegavam" (Santos: 1994, p. 31) e Vicente Lemos relata que "dando desembarque às forças (a expedição), logo apoderou-se do porto e edificou na barra um fortim de madeira, depois de vários ataques dos índios, seguindo-se a fundação da atual fortaleza que por ter sido iniciada no dia 6 de janeiro do ano seguinte (1598) recebeu o nome de Fortaleza dos Reis Magos" (apud MEDEIROS: 1973, p. 28).
Com a construção do Forte dos Reis Magos, a setecentos e cinqüenta metros da barra do Rio Grande, dá-se a oficialização da conquista portuguesa na Capitania do Rio Grande do Norte, e como escreveu Luiz da Câmara Cascudo, "o Forte dos Reis Magos foi a marca, a barreira extrema dos portugueses no norte do Brasil". (CASCUDO: 1955, p. 25).
O "engenheiro" e o "arquiteto" da primeira construção de taipa e barro do Forte dos Reis Magros foi o Pe. Gaspar de Samperes. Com um tempo depois, essa construção foi substituída por uma feita em pedra, cabendo a Francisco de Frias – engenheiro-mor do Brasil – a execução da obra.
Foi durante o período de construção do Forte dos Reis Magos, que surgiu um aglomerado urbano em suas proximidades, formando um arraial, que possivelmente foi habitado em sua maioria por trabalhadores da construção do Forte e, é a partir desse arraial que se deu a primeira povoação da cidade do Natal, em 1599, chamada inicialmente de Cidade dos Reis, cidade de Sant’Lago e ainda cidade do Rio Grande, para finalmente receber o nome de cidade do Natal, que era governada pelo Capitão-mor do Forte dos Reis Magos.
Engenho de Ferreiro Torto e Engenho de Cunhaú
Engenho de Ferreiro Torto
Este engenho de cana-de-açúcar foi o segundo a ser erguido no Estado. Localizado no município de Macaíba e distante 18km de Natal, o Ferreiro Torto transformou-se em museu em 1994, após funcionar como sede do poder Executivo municipal no período de 1983 a 1989.
De início, o solar (casarão) do ferreiro Torto, construído no século XVII, recebeu o nome de Engenho Potengi.
Atualmente, a Prefeitura mantém um museu comunitário, com fotos históricas, cadeiras, utensílios antigos, peças utilizadas na moagem da cana, retratando a vida cultural, religiosa e econômica de Macaíba.
Durante séculos, o Ferreiro Torto portou-se como um fênix, com personalidade e trajetória sólida, sendo destruído por embates e guerras, novamente, reerguido.
Engenho de Cunhaú
Segundo Câmara Cascudo, "o engenho Cunhaú foi construído na sesmaria dada por Jerônimo de Albuquerque em 2 de maio de 1604 aos seus filhos Antônio e Matias. Constava de 5000 braças quadradas na várzea de cunhaú e mais duas léguas em Canguaretama".
O engenho Cunhaú safrejava 6000 a 7000 arrobas de açúcar, sendo exportado para Recife, tornando-se o primeiro centro industrial da Capitania. Possuía um Fortim, sob o comando do Capitão Álvaro Fragoso de Albuquerque.
Até 1925 pertenceu aos Albuquerques Maranhões, foi vendido pela companhia a Baltazar Wintgens e Joris Garstman Van Werve, em 1637. Depois de algum tempo, foi revendido aos flamengos Willem Beck e Hugo Graswinckel.
A invasão holandesa no Rio Grande
Os holandeses mantiveram os primeiros contatos com a capitania do Rio Grande em junho de 1625 (CASCUDO: 1955), quando chegaram à Baía da Traição, transportados por uma imensa esquadra, comandada por Edam Boudewinj Hendrikszoon, que não chegara a tempo para defender o domínio de Salvador, na Bahia.
Na ocasião, muitos dos marujos flamengos encontravam-se doentes, razão pela qual o comandante da esquadra procurou guarida para os mesmos, em terra firme, lá mesmo, na Baía da Traição. Não encontrou um bom tratamento para os enfermos, pois deparou-se com muitos índios assustados com os visitantes, mas, não obstante, conseguiu observar as terras e principalmente a adesão de vários índios potiguares, que viajaram para a Holanda, de onde regressaram alguns anos ulteriores, possuídos pela cultura holandesa, tanto no que diz respeito ao idioma, ao credo e mormente ao ideário, para servir de peça chave quando do domínio holandês no Rio Grande, haja vista a facilidade com que conseguiram a adesão da indiaria potiguar aos fitos dos invasores.
A invasão do Rio Grande deu-se muito mais pela sua localização geográfica, servindo assim de ponto estratégico para o fortalecimento do domínio holandês no Brasil, e pela sua potencialidade no tocante ao fornecimento de provisão, sobretudo carne bovina aos moradores de Pernambuco, que pela sua produção açucareira ou até mesmo potencialidade nesta atividade econômica ou em outras atividades como a aurífera que também as interessava.
A estratégia usada para a invasão consistiu em, primeiro, obter informações sobre o poder de força lusa na capitania e, segundo, fazer o reconhecimento
do litoral potiguar e buscar articulações com a indiaria. Isso se deu inicialmente em outubro de 1631, com o envio de uma grande expedição ao Rio Grande, que terminou por não lograr êxito no tocante à invasão em si, em razão da brava reação do então capitão-mor Cipriano Pita Porto Carreiro.
Uma outra expedição foi enviada em 1633 comandada pelos chefes militares Jan Corlisz Lichthardt e Baltazar Bijma, acompanhados de Mathijs van Keulen e Servaes Carpenter. Esta expedição aportou em Ponta Negra, três dias depois de sua partida de Pernambuco, na manhã de 08 de dezembro do mesmo ano, e ajudadas pelos índios, as tropas holandesas viajara à Holanda em 1625 avançaram sobre a Capitania, sem encontrar resistência, chegando em Natal no período vespertino do mesmo dia, quando imediatamente partiram rumo ao Forte dos Santos Reis, para combaterem as fracas forças portuguesas. Três dias de combates foi o bastante para que as forças portuguesas capitulassem, embora sob o protesto do capitão-mor do Forte, Pero Mendes Gouveia, que se encontrava gravemente ferido. No mesmo dia da rendição, os holandeses assumiram o controle do Forte, tendo como comandante o capitão Joris Gastman, mudaram o nome da fortaleza para Castelo de Keulen, assim como o de Natal para Nova Amsterdã e começaram uma fase de domínio absoluto que ficou caracterizado pelo abandono, violência e rapinagem sobre os povoados então existentes.
Com a assunção do poder, os holandeses trataram de seguir as normas administrativas definidas em um regimento preparado pela Companhia das Índias Ocidentais antes mesmo da invasão a Pernambuco e, posteriormente, um outro trazido pelo Conde João Maurício de Nassau. Segundo estes documentos, os habitantes potiguares que aceitassem passivamente a dominação flamenga ficariam sãos de massacres e da destruição de seus bens. Quanto aos portugueses, o documento estabelecia que deveriam manter seus engenhos de cana-de-açúcar, e para tanto concedia-lhes liberdade de comércio desde que utilizassem seus navios para transportar os produtos comercializados. Os que não se sujeitassem a essa condição seriam obrigados a deixar o País e os seus bens eram confiscados.
Os holandeses, todavia, sempre dispensaram um tratamento especial aos índios, a quem chamavam de brasileiros. Os índios se configuravam como fortes aliados nas lutas contra os portugueses, que sempre tentaram
escravizá-los. Eles, os índios, chegavam de certa forma a ser paparicados pelos holandeses, na medida em que evitavam continuamente constrangê-los ou escravizá-los em trabalhos forçados e, ao contrário, procuravam educá-los e catequizá-los segundo sua cultura e sua religião cristã reformada.
No que se refere à organização administrativa, os holandeses procuraram introduzir uma administração governativa igual à da metrópole e criaram as Câmaras de Escabinos ou Juntas de Justiças e as Freguesias ou Comunas, as quais contavam com três membros, sempre presididas pelo Esculteto, que sempre era representado por um holandês. Aos índios também fora imposta essa forma governativa.
Durante esse domínio holandês (1633-1654) aconteceram massacres sanguinários em Ferreiro Torto, Cunhaú, Uruaçu, Extremoz e Guaraíras, quase sempre praticados pelos índios aliados aos novos invasores. A propósito, esse domínio holandês sobre boa parte do Nordeste do Brasil, começou a dar sinais de fragilidade em 1638, quando da tentativa fracassada da conquista da Bahia, porém a sua longevidade deu-se muito mais por entendimentos políticos entre Portugal e Holanda que por superioridade das tropas flamengas sobre as portuguesas. A prova indelével disso é que quando o mestre de campo Luís Barbalho Bezerra partiu, em 1639, de Touros rumo à Bahia conseguiu seguidas vitórias sobre os holandeses, chegando, inclusive, a prender o comandante do Castelo de Keulen - Joris Gastman.
Primeiros contatos dos holandeses no
Rio Grande do Norte
Por volta da primeira quinzena de junho de 1625, ancora na Baia da Traição a esquadra de Edam Boudewinj Hendrikszoon que vinha na frota de auxílio aos holandeses, na cidade de Salvador, mas atrasara-se devido uma epidemia de escorbuto em sua tripulação. Após atracar em terras potiguares, o almirante flamengo procurou alojar os enfermos e enquanto contactava com índios, mandou o Cap. Uzeel Johannes de Laet e uma patrulha composta de soldados e índios fazer um reconhecimento, o mesmo localizou um engenho onde encontrava-se armazenada uma certa quantidade de açúcar e a criação de grandes rebanhos bovinos, retornando cinco dias após sua saída, trazendo muitos limões para os doentes. Retornaram à Holanda em 1º de agosto do mesmo, levando consigo vários índios potiguares, que voltariam falando holandês e conhecedores da bíblia reformada.
Em 1630 Adriano Verdonck vem com missão de espionagem, recolhendo dados nas terras do Rio Grande, em peregrinação por Cunhaú, Mipibú, Cajupiranga, chegando até Natal, conhecendo o Forte dos Reis Magos, onde faz um levantamento nos mínimos detalhes da referida fortaleza e de artilharia. De posse desses dados, ele tentou vendê-las por dez mil cruzados, sendo capturado pelos holandeses, torturado várias vezes, morrendo em fevereiro de 1631.
Em outubro desse mesmo ano, chega ao Conselho Político do Brasil Holandês, um nativo conhecido por Marcial, fugitivo dos Portugueses, que vem em nome das tribos Carirís, Janduís e Oquenuçu, oferecer aliança com os holandeses. Estes enviaram o Cap. Elbert Smient, com duas naus, sob a
direção de Joost Closter, com eles vieram Marcial e alguns índios que foram em 1625 para a Holanda, além do Judeu Samuel Cochin, homem importante para o Conselho holandês, aportaram 21 léguas ao norte do rio Potengi, num local de nome Ubrantuba, onde desceram Marcial, André Tacou, Araroba e Francisco Matauwe, que iriam reunir os nativos e promover a aliança.
No dia 10 de novembro, atraídos por uma fogueira, atacaram e mataram o português João Pereira, libertando prisioneiros indígenas que seriam vendidos no Rio Grande. Com o português, eles encontraram dados importantes que mais tarde foram usados para conquistar o Ceará. Elbert Smient voltou a Recife e Joost Closter continuou a missão, costeando o litoral, sendo este atacado por portugueses no litoral cearense, vencido e fugido para as Antilhas, amedrontado, onde foi a conselho de guerra e expulso do serviço da companhia.
Com base nas informações do Cap. Elbert Smiente, partiu de Recife no dia 21 de setembro de 1631 com 14 navios, trazendo dez companhias de soldados veteranos sob o cuidado do Tc Hartman Godefrid Van Steyn – Callefels, onde assumiram a direção suprema, os Conselheiros Servaes Carpenter e Van der Haghen, com o intuito de desembarcarem em Ponta Negra, a três léguas de Natal e marcharem sobre a cidade. Servaes Carpenter e alguns oficiais partiram em três Chalupas e chegaram tão perto do Forte que viam perfeitamente os soldados. O Cap-Mor Cipriano Pita Porto Carreiro abriu fogo de canhão contra as chalupas, fazendo-os desistir do assalto ao Forte e as tropas terrestres, após atravessarem o areial até Natal e saquearem Genipabú, sentiram-se esgotadas da marcha e desistiram da investida por terra do Forte, ancorando em Recife a 09 de Janeiro de 1632.
No início de Dezembro de 1633, sai de Recife uma expedição de conquista, composta de 11 navios, 808 soldados, víveres e munições para nove semanas; com eles vieram um dos diretores da Companhia Mathijs Van Kenlen, o Conselheiro Servaes Carpenter e os chefes militares Jan Cortisz Lichthardt e Baltazar Bilma (TC); desembarcaram em Ponta Negra, na manhã de 08/12/1633 e, ao entardecer, invadiram a cidade, provocando pavor nos moradores. Ao anoitecer acamparam junto às dunas, próximo ao Forte. O Cap. Mor Pero Mendes Gouveia com seus 86 soldados abriram fogo contra a horda de holandeses, a princípio com uma tropa entrincheirada nas dunas próximas ao Forte, recuando para dentro da Fortaleza, por acreditar que teria melhores chances de defesa. Ao recuar para o interior da Fortaleza, os holandeses apossaram-se das dunas, de onde fizeram seus
canhões e granadeiros, bombardeando sem trégua, durante cerca de quatro dias. Na manhã de 12/12/1633, foi erguida a bandeira branca em sinal de rendição. O Cap. Mor Gouveia estava muito ferido, não participando das negociações, sendo estas feitas pelo Sgt. Pinheiro Coelho, Simão Pita Ortigueira e Domingos Fernandes Calabar, ambos presos de justiça.
O Cap. Mor Pero Mendes de Gouveia recebeu homenagem militar dos holandeses e foi medicado por Nicolaes, cirurgião da expedição, morrendo em Goiana ou Itamaracá, entre 1646 e 1647, onde morava.
A tomada do Forte
A 5 de dezembro de 1633, zarpava de Recife uma esquadra comandada pelo Almirante Jean Cornelissen Liichthord, com o objetivo de conquistar o Forte dos Reis Magos. Esta esquadra era composta de 4 navios e 7 iates. Neles embarcavam 808 homens.
O tenente-coronel Baltasar Bima, comandava as operações militares. Também fazia parte desta expedição, o conselheiro Carpentier e Matais Vau Keulen, um dos diretores da Companhia das Índias Ocidentais.
No dia 8 de dezembro, dá-se o desembarque em uma praia estreita, cercada de altas barreiras (até hoje não se sabe ao certo se era Ponta Negra). Daí separam-se as tropas, seguindo uma pelo mar, outra por terra, atravessando as dunas até chegar em Natal.
Os Holandeses construíram seus acampamentos nas proximidades do Forte, de forma que ficariam protegidos do ataque dos que lá estavam, por uma duna quase tão alta quanto o Forte.
Diante da recusa do Comandante do Forte, Pero Mendes Gouveia, em ceder ao pedido dos holandeses, que queriam tomar o Forte, o combate se inicia em 8 de dezembro. No dia 10, o comandante do Forte é gravemente ferido. No dia 12, surge uma bandeira branca sobre as muralhas da Fortaleza, pedindo paz, a luta era de total incompatibilidade, 808 flamengos contra 85 portugueses. Ao ver a bandeira branca, o tenente-coronel Baltasar envia uma mensagem ao comandante do Forte, pedindo que ele se rendesse imediatamente; este, no entanto, negou-se e afirmou não ter sido dele a idéia de pedir paz.
Dentro do Forte havia pessoas estranhas e estes haviam colocado a bandeira pedindo a paz, entre as pessoas estavam um foragido, um condenado à morte e outro que havia vindo na expedição. O coronel Baltasar recebe uma carta de rendição e a recusa por não ter a assinatura do comandante, mas o Sargento Sebastião Pinheiro Coelho, que era o foragido que estava refugiado no Forte, afirma ter assumido o comando, uma vez que Pero Mendes encontrava-se enfermo e incapaz de tomar alguma decisão.
As negociações são feitas, os holandeses atendem a algumas reivindicações dos derrotados e ,no forte, é hasteada a bandeira dos flamengos, substituindo a bandeira portuguesa.
Isso aconteceu em 12 de dezembro de 1633, iniciando-se assim o domínio holandês no Rio Grande do Norte, seguindo-se até 1654.
Após tomarem o Forte, os holandeses se mostraram solidários com os derrotados, prestaram socorro ao comandante Pero Mendes e o enviaram para Recife.
Há historiadores que consideram a tomada do Forte como sendo possibilitada por uma traição, visto as negociações terem sido feitas com um preso e outro condenado à morte. Outros consideram realmente rendição.
Em homenagem ao diretor da Companhia das Índias Ocidentais, os holandeses trocaram o nome de Fortaleza dos Reis Magos por Castelo de Keulen.
Durante o domínio holandês o nosso Estado foi governado por 3 capitães: Joris Garstman Bijles, Johans Blaenbeeck, Jan Denniger e um major: Bayert, todos eles flamengos.
A atuação do domínio holandês, limitou-se às regiões do litoral e do agreste.
Os Holandeses e os Tapuias
Interessados em assegurar o seu controle sobre a Capitania do Rio Grande, os holandeses cedo firmaram alianças com os povos ditos Tapuias, com a "urgência de encontrar aliados, em número e força, para a manutenção do [ seu ] domínio" (PUNTONI, 1998, p. 38). Segundo CASCUDO, em 1631, dirigiu-se ao Conselho Político do Brasil Holandês o índio "Marcial ou Marciliano, fugitivo dos acampamentos portugueses, informando que seus companheiros [ os "reis" Janduí e Oquenaçu, Tapuias da Nação Tarairiú ] estavam desejosos de uma aliança com os invasores" (1984, p. 61).
Durante o período da Dominação Holandesa no Nordeste (1630-1654), a política da Companhia das Índias Ocidentais será a de relações amigáveis com os Tapuias, visando à sua participação no processo de colonização. O próprio Conde de Nassau "reconhecia a importância de manter tais aliados [ pois da ] amizade dos índios dependia em parte o sossego e a conservação da colônia do Brasil" (citado por PUNTONI, obra citada, p. 39). A aliança dos flamengos com os indígenas do interior da Capitania do Rio Grande foi relativamente pacífica, pois, ao contrário dos portugueses, os holandeses concederam aos Tapuias uma aparente liberdade e a não-escravização, além de manterem relações bastante íntimas.
A pedido do Conde Maurício de Nassau, o judeu alemão Jacob Rabbi foi ao interior da Capitania do Rio Grande e passou quatro anos junto aos Tapuias Janduís, chefiados pelo "rei" de mesmo nome. Além de servir de intérprete dos Janduís para os holandeses, sua permanência entre os índios fortificava os laços de aliança política. Jacob Rabbi assimilou e adotou muitos dos costumes dos indígenas e, através dessa sua adaptação, tornou-se um
verdadeiro líder, fazendo com que os Tarairiús tornassem-se "uma espécie de matilha fiel, sempre pronta ao aceno do caçador para perseguir e despedaçar a caça levantada" (CASCUDO, 1992, p. 50).
Rabbi foi autor de uma crônica relatando a vida e os costumes dos Tapuias, a qual foi oferecida ao Conde Maurício de Nassau. Através dessa crônica muitos aspectos etnográficos dos Tapuias são hoje conhecidos, pois foi utilizada por outros autores holandeses, em seus relatos. Além de Rabbi, outro holandês viveu entre os súditos do "rei" Janduís. Trata-se de Roulox Baro, que visitou o chamado "País dos Tapuias" (PUNTONI, obra citada, p. 40), no final da primeira metade do século XVII. O relato essa viagem acha-se incluído no livro História das Últimas Lutas no Brasil entre Holandeses e Portugueses e Relação da Viagem ao País dos Tapuias (1647), de Pierre Moreau e Roulox Baro, respectivamente. Escreveram, ainda, sobre os Tapuias: Joannes de Laet, com a História ou Anais dos Feitos da Companhia Privilegiada das Índias Ocidentais, desde o seu começo até o fim do ano de 1636 (1647); George Marcgrave, com a História Natural do Brasil (1648); Guilherme Piso, com a História Natural e Médica da Índia Ocidental (1658); Joan Nieuhof, com Memorável Viagem Marítima e Terrestre ao Brasil (1682); Elias Herckman, com Descrição Geral da Capitania da Paraíba (1639) e Zacharias Wagner, com Zoobiblion.
Por meio desses relatos podemos ter uma idéia – embora, na visão dos europeus - do modo de vida, costumes e hábitos dos Tapuias que habitavam o Sertão do Rio Grande, informações essas que foram compiladas por Olavo de MEDEIROS FILHO (1984 e 1998) em duas obras sobre o passado potiguar, Índios do Açu e Seridó e Os Holandeses na Capitania do Rio Grande.
Os Massacres
Massacre no Ferreiro Torto
Tantos massacres se sucederam por aqui, nas denominadas terras do Rio Grande, que fica difícil não nos constrangermos com tantas barbaridades. Esses atos de violência e enorme crueldade que caracterizaram o domínio holandês, aqui nessas terras, começou pelo ataque aos moradores do engenho Ferreiro Torto. A expedição desembarcou no local conhecido por " Passagem do Potigi" . Depois de terem matado algumas pessoas neste local, seguiram adiante por terra, para o já citado engenho. Hélio Galvão assegura que os " atacantes fugiram e o major Cloppenburch prosseguiu, andando mais três léguas, desde aquele ponto em que ele com os outros companheiros desembarcara. Um trecho pantanoso do caminho, já sendo tarde, impediu que atingissem o engenho, pelo que decidiram regressar à fortaleza" . ( GALVÃO: 1979, p. 83). Ao mesmo tempo corria o boato que forças portuguesas estariam a caminho, vindas da Paraíba, para ajudar os que alí se encontravam. Mas os holandeses não admitiam que se organizassem focos de resistência à sua autoridade. "Convocaram, então, o cacique Janduí, inimigo mortal dos portugueses. Na luta que se travou em ferreiro torto, morreram Francisco Coelho, proprietário do engenho, sua mulher, cinco filhos e sessenta pessoas que estavam lá refugiados". (CASCUDO: 1992, p. 14).
O Massacre de Cunhaú
O primeiro engenho construído no Rio Grande do Norte, foi palco de uma das mais trágicas páginas da nossa história. " Este engenho era a menina dos olhos dos holandeses por causa da fertilidade das suas terras" (SOUZA: 1999, p. 40). O ano era 1634, e nesse fatídico dia, sem que
ninguém esperasse, pois foram enganados por Jacob Rabbi, o comandante da tropa de tapuias, potiguares e holandeses que ali chegaram com a ordem de matar todos que ali se encontravam. Esse homem indescritível, aportara por aqui para servir de intérprete entre os holandeses e os tapuias. Mas o ocorrido em Cunhaú, demonstrou que ele foi mais que um simples intérprete.
Diversos historiadores nos relatam que esse engenho foi fundado pelos irmãos Antônio e Matias de Albuquerque, na sesmaria que receberam do seu pai, Jerônimo de Albuquerque. Obedecendo a um pedido de Rabbi para que comparecessem à Igreja para tratar de um certo negócio e prometendo não ferir ninguém, muitas pessoas foram à capelinha, no dia marcado. Mas a intenção de Rabbi era outra. E, quando estavam todos ali reunidos começou a matança iniciada pelos tapuias chefiados por Jererera. Foram de uma crueza e violência sem par. "O oficiante voltou-se para os algozes e lhes disse na língua deles, em que era perito, que se tocassem em sua pessoa ou nos paramentos sagrados seriam castigados. Alguns recuaram outros nem o escutaram e os abateram". (GALVÃO : 1979, p.86). "Depois deste massacre, nunca mais os holandeses tiveram paz em Cunhaú, sucessivos atos de vingança foram realizados àquele engenho pelos portugueses"( CASCUDO: 1992, p. 35).
A chacina desse engenho promoveu uma tomada de consciência, por parte da população portuguesa, fazendo-a empenhar-se , com redobrado vigor, à tarefa de combater e expulsar os dominadores flamengos.
O Massacre na casa forte de João Lostão Navarro
Depois da matança no engenho Cunhaú, o pânico tomou conta da população daquela região. Quem não se refugiou nas fronteiras da Paraíba com o Rio Grande, dirigiu-se para a casa do sesmeiro João Lostão, situada "no desaguadouro da lagoa de papari, barra do camurupim" (CASCUDO: 1995, p. 69). Ele era sogro de Joris Garstman, primeiro governador holandês do nosso Estado.
Os holandeses temiam que aquele lugar viesse a se transformar em perigoso núcleo de resistência; trataram de expulsar os pobres colonos. Eles entendiam (os holandeses), que esses colonos estavam se preparando para uma rebelião. Sendo ameaçados e intimidados várias vezes por Rabbi e sua tropa, eles argumentavam que estavam ali para se protegerem, pois temiam por suas vidas, ameaçadas pelos selvagens. Mas o temível, o
nsaciável Rabbi não aceitou aquele argumento. Comandou e ordenou mais uma vez o ataque, promovendo outra carnificina, que foi realizada pelos Janduís e Potiguares. "Assassinaram de quinze a dezesseis pessoas, e trouxeram preso, para a fortaleza, João Lostão Navarro" (SOUZA: 1999, p. 44).
O Massacre de Uruaçu
Espantados com o que aconteceu em Cunhaú e na casa de João Lostão Navarro, alguns colonos "refugiaram-se nas margens do Rio Potengi, três léguas de Natal, erguendo uma defesa murada de madeira rústica" (CASCUDO: 1955, p.83). Depois de passarem por tantos massacres, tanta carnificina, resolveram se defender erguendo essa fortaleza de madeira. E mais uma vez foram enganados. Acreditando na conversa dos holandeses que poderiam sair da fortaleza pois estavam a salvos dos tapuias, os moradores acima citados caíram mais uma vez numa cilada. E foram massacrados assombrosamente pelos brasilianos que os esperavam no lugar em que foram levados pelos holandeses. E estes os ajudaram a matá-los, arrancando os olhos a uns, tirando as línguas de outros, "cortando as partes vergonhosas e metendo-lhes nas bocas" (CALADO: 1945, p. 151-2). Trazendo o restante que tinha ficado na cerca para esse mesmo local, enganando-os também, iniciaram novo massacre, sem deixar nenhum vivo. E foi de uma barbaridade tão grande que "seus membros foram divididos em partes que não se conhecia quais eram os de cada um dos ditos mártires. No mesmo instante foram os mesmos tiranos flamengos, e brasilianos à cerca, aonde somente ficaram as pobres viúvas, e órfãos, e as acabaram de despojar de todos seus bens, deixando-as a muitas nuas e com outros opróbrios, que passo em silêncio"(CALADO: 1945, p.151– 2).
A morte de Jacob Rabbi
Não podemos terminar a descrição destes massacres, sem darmos uma notícia sobre o final da vida do seu principal mentor: Jacob Rabbi. Ele, que colecionou tantas mortes na terra Potiguar, morreu assassinado por dois soldados, na madrugada de 5 de abril de 1646, a mando do comandante Joris Garstman, que desta maneira, vingara a morte de João Lostão Navarro ( SOUZA: 1999, p. 47).
O Processo de Beatificação dos
Mártires de Cunhaú e Uruaçu
Os católicos brasileiros, desde muito tempo, sentem o desejo de possuírem os seus próprios santos. Apesar dos sincretismos históricos e do atual avanço dos evangélicos; o Brasil ainda é a maior nação católica do mundo. Esse desejo de possuir os seus próprios santos, não poderia estar de modo algum ausente no Nordeste do Brasil, devido a sua religiosidade católica–romana, herdada de Portugal. Sendo assim, no Nordeste não faltam possíveis santos, exemplo disso é o caso norte-rio-grandense, dos mártires dos engenhos de Cunhaú e Uruaçu, respectivamente localizados onde hoje ficam os municípios de Canguaretama e São Gonçalo do Amarante.
Os massacres que produziram os mártires, ocorreram em 16 de julho de 1645, no engenho de Cunhaú, e em 03 de outubro de 1645, em Uruaçu. Os assassinos eram índios (tapuias e potiguares) e holandeses chefiados pelo mercenário alemão Jacob Rabbi. Os massacres ocorreram devido a suspeita, por parte dos holandeses, de uma conspiração portuguesa contra o domínio holandês. Morreram cerca de 180 pessoas ao todo, mas apenas se sabem informações sobre 30 deles, motivo pelo qual são os únicos arrolados nos processos canônicos. Foram mortos por não abraçarem a fé reformada, pois seriam poupados se o fizessem.
Os 30 mártires foram aprovados como beatos em junho de 1998, pela Comissão das causas dos Santos, depois de analisarem o parecer dos Teólogos e do Promotor da fé, e o decreto foi proclamado pelo Papa II, em 21 de dezembro de 1998; depois de muito clamor do povo norte-rio-grandense e do trabalho da Arquidiocese de Natal, na pessoa destacável
do Mons. Francisco de Assis Pereira, o Postulador da Causa dos Santos.
O processo dos mártires encontra-se agora rumo à canonização, que se concretizada, dará ao Brasil os seus "primeiros " santos mártires brasileiros. Para tal, precisa-se da comprovação de um milagre, já que as regras para a canonização, no caso da comprovação do martírio, ser menos exigente neste ponto.
O Seridó e a guerra do Paraguai
O conflito platino pegou de surpresa os provincianos potiguares, obrigando as elites potiguares a arregimentar, às pressas, "voluntários" para dar combate a Solano Lopez. Embora afirme-se que "essa medida espalhou pânico e a lavoura foi quase abandonada" (LIRA: 1982, p.240.), José Augusto, ao escrever o ensaio biográfico de José Bernardo - chefe político seridoense cuja ação política discutiremos adiante -, faz crer que o recrutamento no Seridó ocorreu sem maiores atropelos, mediante o trabalho de convencimento daquele líder político. Primeiro, José Bernardo, "inflamado de ardor cívico", ofereceu-se para incorporar-se no contingente provincial e consigo levaria 78 voluntários. Depois, por solicitação do Presidente da Província, conseguiu ainda acrescentar aos primeiros um "novo contigente de voluntários, todos seus conterrâneos, parentes e amigos, [e] à frente dos seus comandados, embarcou para o Rio de Janeiro, onde chegou a 29 de dezembro. O contingente por ele conduzido foi mandado seguir para o Paraguai, adido a um corpo de voluntários do Piauí, mas a oficialidade, inclusive José Bernardo, foi dispensada [grifos nossos], regressando ao Rio Grande do Norte em 23 de janeiro de 1866" (MEDEIROS: 1954, p. 197).
É bem provável que esse recrutamento não tenha ocorrido de forma tão pacífica quanto imaginava José Augusto, o que nos levaria a concordar com Tavares de Lira. Para ficarmos em um exemplo próximo, basta que atentemos para a situação do Ceará, à mesma época, onde o temor do recrutamento provocou deserções antecipadas que colocaram em cheque a utilização da mão-de-obra livre, num momento que a economia cearense se ressentia da carência da mão de obra escrava (PINHEIRO: p. 199-230).
Revoltas populares na Província do Rio Grande:
O "Quebra-Quilos" e o "Motim das Mulheres"
A revolta do Quebra-Quilos, em fins de 1874 a meados de 1875, por sua conotação popular, preocupou as autoridades provinciais de forma mais incisiva. Afinal, vilas inteiras do Norte rebelaram-se contra a implantação de um novo sistema métrico, saqueando feiras e destruindo pesos e medidas do comércio. Os pesos e medidas eram alugados ou comprados à Câmara Municipal, que cobrava ainda por sua aferição. Um dos impostos que provocaram a ira dos revoltosos foi o chamado "imposto do chão", cobrado àqueles que expunham suas mercadorias no chão da feira. Na verdade, não podemos reduzir essa sedição somente à insatisfação contra a imposição do novo sistema de mensuração das mercadorias. O Quebra-Quilos foi a gota d’água entornada no caldeirão de novos impostos e novas regras de recrutamento - dizia-se na época que não escapariam do "voluntariado" militar nem as pessoas de posses. Por essas razões, juntavam-se na mesma turba de revoltosos, comerciantes, elementos da camada proprietária, pequenos agricultores que vendiam sua produção semanalmente na feira e consumidores atingidos com a elevação de preços dos produtos. No Rio Grande do Norte, das 13 vilas rebeladas, cinco eram do Seridó: Acari, Currais Novos, Flores, Jardim e Príncipe. A repressão foi bem sucedida, "foram enviadas forças militares que conseguiram, sem esforço maior, a pacificação pública" Cf. CASCUDO, L. da C. Op. cit., p.183. Sobre este movimento veja-se: MONTEIRO, H. de M. Crise agrária e luta de classes, pp. 129-56; CASCUDO, L. da C. . Op. Cit,. pp. 182-3 e MAIOR, A. S. Quebra-Quilos – lutas sociais no outono do Império, 2ª ed.
O chamado "motim das mulheres" em Mossoró, expressou-se dentro desse contexto. Os ânimos exacerbados com as novas medidas de recrutamento provocaram a mobilização de cerca de trezentas mulheres, que rasgaram as listas de sorteio do recrutamento afixados na igreja daquela cidade. Dentre as três mulheres apontadas na época como responsáveis pela revolta, estava Dona Maria Filgueira, esposa do Capitão Antônio Filgueira Secundes. A esse respeito consulte-se ROSADO, V.-U. O motim das mulheres - um episódio do Quebra-Quilos.
A última eleição do Império no Rio Grande do Norte
Com o fortalecimento das instituições político-partidárias (Partido Liberal e Partido Conservador), foi desencadeada uma aferrada luta por espaço político entre os partidários de ambas as correntes políticas. Nesse momento, no Brasil, para apaziguar os ânimos políticos, a saída racional foi implantar o voto distrital . Na Província do Rio Grande do Norte, dividiu-se, nesse sentido, o território provincial em dois distritos eleitorais: o primeiro distrito no Litoral e o segundo, no Interior ou Sertão.
O Partido Liberal assumia o domínio político naquela ocasião. No Litoral, a maior expressão política era o liberal Amaro Bezerra que, aliás, foi quem organizou o diretório do Partido Liberal, em 1868, e no Interior o mais expressivo político era o também liberal José Bernardo de Medeiros. Ocorre que no interior desta corrente política dominante eclodiram disputas internas seriíssimas entre os líderes Amaro Bezerra e José Bernardo de Medeiros, quando da indicação dos candidatos para a Câmara dos Deputados. Amaro Bezerra, antes aliado fidedigno de José Bernardo, desprezou a força política de seridoense liberal e indicou o Dr. Francisco Luís da Gama Rosa pelo segundo distrito. José Bernardo, em retaliação, indicou Miguel Joaquim de Almeida Castro, contrariando frontalmente a indicação do líder liberal Amaro Bezerra.
Amaro Bezerra, indignado, resolveu ele mesmo candidatar-se pelo segundo distrito, para tentar arrasar, politicamente José Bernardo. A disputa foi acirrada. Animada pelos órgãos de imprensa pertencentes a cada facção, no caso o jornal O Liberal, pertencente a Amaro Bezerra e o jornal O Povo, de propriedade de José Bernardo, cognominado Bispo do Seridó.
Dominando o eleitorado do interior através de um bem articulado leque de acordos, o candidato indicado por José Bernardo foi vitorioso, marcando assim a liderança indiscutível do "bispo do Seridó" e delineando essa região como uma importante área política no Rio Grande do Norte.
Essa mudança, embora ocorrida de forma paulatina, permitiu ao Seridó continuar no crepúsculo do Império e alvorecer da República, como protagonista político, através de José Bernardo e toda a plêiade que lhe acompanhava, permanecendo com essa notabilidade na política até os dias atuais.
O Movimento Republicano no Rio Grande do Norte - pioneirismo seridoense
A sociedade seridoense em fins do Império passa por transformações diversas, não apenas no que diz respeito à economia, mas também com relação aos saberes. Surge uma nova elite intelectual formada por filhos de proprietários rurais, os quais buscavam formação acadêmica na Faculdade de Direito de Recife, conhecido centro de idéias revolucionárias.
A província do Rio Grande, devido a sua condição subalterna, e influenciada por Pernambuco, anteriormente envolveu-se de forma acanhada em insurreições iniciadas na capital pernambucana, as quais foram sufocadas em sua origem (1817 e 1824).
Quanto ao movimento republicano, mais uma vez é sentida a influência pernambucana no Seridó, tendo em vista que as relações entre ambas as regiões não se limitavam aos contatos econômicos. Recife e Olinda tiveram um significado muito importante no que se refere à formação intelectual das elites seridoenses. Essa geração formada em Recife constituiu a elite intelectual e política quando no Seridó despontou a cotonicultura. Esses novos saberes científicos sustentaram os discursos regionalistas da época, expressando idéias progressistas.
O Seridó foi palco do pioneirismo no Rio Grande do Norte, ao abrigar o primeiro núcleo republicano, fundado no Príncipe (Caicó), em 25 de Julho de 1886, tendo como presidente Manuel Sabino da Costa.
Como veículo de comunicação, os republicanos conseguiram espaço no jornal "O POVO", que tinha como redator o acadêmico de direito Diógenes Nóbrega. As reflexões que faziam giravam em torno da construção do Estado Nacional, interpretando a realidade brasileira através dos modelos europeus, contestando, assim, a ordem monárquica aqui existente. As páginas do jornal "O POVO" serviram à propaganda republicana. Nelas foram publicados o Manifesto Republicano ao Povo Seridoense, e a Ata Sessão de instalação do Centro Republicano Seridoense. Merecendo destaque a figura de Janúncio Nóbrega, nome fundamental para o movimento republicano no Seridó. Também apareciam como redatores do jornal "O POVO ", as figuras de Manuel Dantas e Olegário Vale que propagandeavam posições do Partido Liberal.
O Início da cotonicultura no Rio Grande do Norte
A cotonicultura representou, nas chamadas províncias do Norte, a única cultura que concorreu de forma marcante com o açúcar, em termos de exportação para o mercado internacional.
Na passagem do século XVIII à centúria seguinte, o algodão emergiu de produto consumido no âmbito restrito do setor de subsistência nordestino, à mercadoria significativamente inserida nas trocas comerciais brasileiras com o mercado internacional.
O Nordeste agrário não-açucareiro será redefinido, portanto, pelo algodão. A razão dessa alavancagem agrícola e comercial processa-se ao sabor das injunções do mercado mundial. Notadamente, podemos perceber que por duas vezes sua extroversão para o mercado inglês é o contraponto de crises conjunturais ocorridas nos Estados Unidos da América: primeiro a Guerra da Independência Americana (1776-1783) e segundo a Guerra da Secessão (1860). Em ambos os casos, privada de sua principal fonte fornecedora, a Inglaterra terá de procurar outros mercados de matérias-primas para abastecer o parque têxtil britânico.
Esse cenário internacional provocou a criação de outras áreas agrícolas nas províncias do Norte que não aquelas áreas voltadas para a atividade açucareira. Nesse sentido, adentrando-se pelos sertões, essa cultura ocuparia espaços antes orientados majoritariamente para a pecuária. Diferentemente dessa, porém, teria como característica inusitada para esse espaço, a produção agrícola para o mercado exterior.
No primeiro surto exportador despontou o Maranhão como maior produtor de
algodão do Brasil. No segundo, ocorreu a expansão dessa cultura pelos territórios sertanejos e agrestinos do Norte.
Uma outra característica que se salientou de ambos os fluxos acima descritos foi a precária continuidade da produção - no sentido de sua extroversão para o mercado estrangeiro. Tal fato denunciou-se pela clara dependência do comportamento do contexto político americano: tão logo contornadas as crises estadunidenses, o algodão nordestino retraía-se, visto que o parque têxtil inglês retomava suas transações comerciais com os EUA.
Tal retraimento não significou, óbvio, o desaparecimento da cotonicultura. No século XVIII, quando ocorreu a desaceleração dessa cultura para o mercado exterior, ela se redefiniu, ocupando o nicho reservado às culturas de subsistência. Mais adiante, a partir de fins do século XIX, embora nunca tivesse cessado de todo a demanda externa, o algodão passou a ser escoado para a crescente indústria têxtil brasileira. Assim, "o desenvolvimento da indústria têxtil algodoeira nacional garantiu a permanência da cotonicultura como setor agrícola de peso na economia nordestina" (TAKEYA: 1985, p.30).
Conforme apontam os elementos que trabalhamos até o momento, historicamente, o espaço norte-rio-grandense fundou-se sobre duas bases: agrícola e pecuária. A peculiaridade desse espaço não proporcionou, por muito tempo, uma exploração agrícola pautada somente na monocultura açucareira de forma a definir perenemente toda a economia, seja da capitania, província ou estado. Isso se deve, em grande parte, a uma particularidade geográfica que salta aos olhos no mapa norte-rio-grandense.
O espaço potiguar possui somente uma pequena faixa de terras propícias a essa atividade açucareira. A área destinada a essa cultura restringiu-se a uma pequena porção do litoral oriental, ao passo que a pecuária ocupou todo o sertão. Será nesse último que o algodão encontrará condições ecológicas, sócio-econômicas e políticas para se desenvolver. (Ver "O algodão na economia seridoense")
O algodão na economia seridoense (1880-1915)
Nos sertões, a agricultura desenvolveu-se à sombra das atividades pastoris, sem se salientar como excedente para trocas comerciais consideráveis. Somente com a grande seca de 1845 foi que, com a dizimação de quase todo rebanho, as culturas agrícolas nessa área adquiriram alguma visibilidade. Nesse contexto, começa a sobressair-se o cultivo do algodão e principalmente uma variedade típica do Seridó, que ocuparia um lugar de destaque na economia estadual quando o açúcar descrevia sua curva produtiva descendente a partir da década de 1880 e seria superado pelo algodão em 1905. "O algodão não seguiu a mesma trajetória que o açúcar, pois o fim da fase áurea da exportação para o mercado externo, da década de 1860, não significou sua estagnação ou retrocesso; pelo contrário, foi em anos posteriores a essa fase que se expandiu o cultivo pelo sertão norte-rio-grandense, de uma variedade de algodão característica do meio - o algodão mocó ou algodão seridoense" (TAKEYA: 1985, p. 33).
Embora prioritariamente voltado para o mercado interno em favor das indústrias têxteis nacionais, o algodão norte-rio-grandense também encontrava colocação no mercado estrangeiro. O crescimento do volume desse comércio, no entanto, era contido pela baixa qualidade de sua fibra, incompatível com a padronagem dos tecidos mais elaborados, fato que o fazia pouco competitivo nos negócios de exportação. Características inferiores contribuíam para que ele se amoldasse à indústria têxtil nacional que principiava produzindo tecidos de baixa qualidade com os quais se afinavam o algodão produzido no RN.
Somente o algodão "mocó", de fibra longa, poderia ocupar esse lugar de excelência no mercado exportador internacional, posto que se destinava à confecção de tecidos finos.
A princípio duas variedades de algodão eram plantados no RN: o arbóreo ("mocó" ou "Seridó") e o herbáceo. O algodão "mocó" foi a variedade que melhor se adaptou aos sertões: por suas raízes profundas, era mais resistente às secas; por seu vigor, era uma variedade mais infensa às pragas e ,por outro lado, produzia até por 8 anos. Em suma, era muito mais vantajoso que o herbáceo, que tinha um ciclo vegetativo muito curto - geralmente um ano e, além disso, mais suscetível a pragas.
No entanto, orientado para o mercado interno, o algodão nordestino perderia paulatinamente, a partir de meados da década de dez, sua posição hegemônica como principal matéria-prima consumida pela indústria têxtil do Sudeste.
As crises de oferta da fibra nordestina estariam ligadas, por um lado, às devastadoras secas que atingiam impiedosamente as lavouras sertanejas e, por outro, a uma redefinição da produção agrícola paulista, que em 1918, com a geada que destruiu os cafezais e, posteriormente, o retraimento abissal do cultivo do café com a crise de 1929, terminaram por reorientar largos espaços agrícolas para a cotonicultura.
Outras variedades, como o Sea-Island e o Upland, americanos, e o Jumel, egípcio, foram testadas no Rio Grande do Norte não sem antes despertar desconfiança naqueles que pensavam o desenvolvimento regional a partir da produção do puro algodão "mocó" ou "Seridó". Juvenal Lamartine de Faria refletindo sobre a inconveniência da importação de variedades exóticas no sertão, na Conferência algodoeira de 1915, assim se expressava: "não vejo nenhuma vantagem na importação de segmentos estrangeiros, principalmente americanas, donde poderemos importar também parasitas, ainda desconhecidos entre nós como o terrível Boll Weevil ... No nordeste brasileiro que como disse, tem que ser o centro de nossa produção algodoeira, reputo erro, substituir por uma variedade estrangeira, quase toda anual,o nosso algodão mocó - verdadeira lavoura das regiões secas" (FARIA: 1915, p. 226)
As suspeitas de Juvenal Lamartine tinham fundamento se levarmos em conta a praga da lagarta rosada - "terrível polvo [que] distende seus tentáculos sobre alguns dos nossos destemidos e empreendedores agricultores" (O seridoense,24/05/1918) - que chegaria a dizimar 2/3 das lavouras nordestinas e teria sido, possivelmente, embarcada do Egito, com os lotes de sementes de algodão importadas daquele país, entre os anos de 1910 e 1913. Além de pragas e secas, o algodão foi fragilizado geneticamente pela hibridação natural entre o algodão mocó e aquelas variedades alienígenas.
Enquanto deteve a reputação de algodão de primeira qualidade, o Seridó foi celebrado, seja pelos intelectuais da elite seridoense, seja em eventos fora do Nordeste. Registrou o Dicionário Geographico e Etnographico do Brasil em 1922: "O produto é de ótima qualidade. Na Exposição Nacional de 1908, o da zona do Seridó obteve o grande prêmio e o de toda a região sertaneja alcança sempre cotações superiores nos mercados internos e externos". Esta variedade "mocó" ou "Seridó" teve um dos seus mais fortes e propositivos defensores em Juvenal Lamartine. A partir dele poderemos perceber a montagem do espaço algodoeiro no discurso regionalista seridoense.
A Instauração da República no RN:
Centralização x Descentralização
Às vésperas da República, o Rio Grande do Norte contava com três partidos políticos: o Conservador - dividido entre o "grupo da Botica" e o "grupo da Gameleira"; o Liberal - dividido entre Amaro Bezerra e José Bernardo e o Republicano, liderado por Pedro Velho e Janúncio Nóbrega.
Com a proclamação da República Pedro, Velho assume o poder e faz aliança com os antigos monarquistas que, na época, faziam oposição aos Liberais na liderança do Estado. Ao compor seu ministério com uma maioria de conservadores, Pedro Velho frustrou os republicanos e ligou-se aos interesses de classe dos grandes proprietários rurais, abrindo espaço à consolidação das oligarquias. Um mês após a Proclamação da República, Adolfo Gordo foi nomeado para governar o Rio Grande do Norte, onde tentou unificar os procedimentos administrativos estaduais. Este fato não agradou aos republicanos locais, pois estes eram oligarcas e criticavam a centralização.
Proclamada a República, Deodoro assume a presidência, através de um golpe. Em 1891 é realizada a primeira eleição para presidente e Deodoro, defendendo uma política centralizadora, foi eleito, derrotando Prudente de Morais e Floriano Peixoto, favoráveis à descentralização. Expressando a divisão do legislativo e a oposição a Deodoro, Floriano foi eleito para a vice-presidência. A bancada potiguar dividiu-se entre Pedro Velho, que apoiava Prudente de Morais, e Amaro Cavalcante, que apoiava Deodoro. Tendo os dois grupos a mesma origem - grandes proprietários de terras - surge no interior dessa classe social um conflito por questões antagônicas, que Janice SILVA chamou de "oposições significativas". Ambos os grupos
são irredutíveis na luta pelo perfil do Estado Republicano e como não há um consenso, realiza-se a eleição para deputados estaduais e a facção pedrovelhista é afastada do poder.
Entretanto, os desdobramentos da crise política nacional obrigaram Deodoro a renunciar ao cargo. Com Floriano na presidência surge uma nova situação no Rio Grande do Norte, realizam-se outras eleições e Pedro Velho é eleito para o governo do Estado, encerrando o período das oposições significativas caracterizadas por uma verdadeira ruptura. Os centralizadores defendiam a construção de um estado nacional baseado na diminuição do poder das oligarquias regionais, com uma política econômica de crédito à indústria; já a descentralização conferia maior autonomia à oligarquia no controle regional. As elites agrárias vinculadas ao capital internacional não aceitavam o centralismo político e econômico, tendo em vista grandes perdas.
Do açúcar para o algodão: a mudança do eixo econômico favorece o interior do Estado
A cana-de-açúcar era cultivada em torno "plantation" e o algodão dividido em pequenas e isoladas culturas. A economia açucareira no RN começa a enfrentar a crise, uma vez que o açúcar vai perdendo seu valor no mercado internacional, determinada pela concorrência nos mercados externos, carência de mão-de-obra, atraso tecnológico, etc.
Com a insignificância do açúcar nordestino no mercado externo, ocorre o crescimento do algodão e também a penetração do capital industrial na economia do Estado, desenvolvendo a diversificação de atividades e o crescimento urbano. Esse processo pode ser caracterizado pela exportação de capitais e integração ao sistema econômico internacional do capitalismo e à divisão intranacional do trabalho. Inclusive, em 1910, o governador Alberto Maranhão iniciou com banqueiros franceses uma operação de empréstimo externo para a modernização da capital.
A Primeira Guerra Mundial estabeleceu a hegemonia da cotonicultura na economia estadual, favorecendo o aumento das rendas públicas, procedendo do fortalecimento da máquina regional do Estado, com a profunda reorientação da política econômica do governo estadual para o algodão-pecuária (no Seridó).
No mundo político surgem os efeitos dessa mudança em 1914: Ferreira Chaves, apoiado por políticos seridoenses, rompe com os Maranhão e consegue ser o primeiro político republicano eleito governador fora do esquema daquela oligarquia.
No entanto, quando Ferreira Chaves tenta posteriormente se candidatar novamente (1923), José Augusto e Juvenal Lamartine reagem com apoio dos coronéis seridoenses. Com a intervenção de líderes do governo no senado e na Câmara Federal, José Augusto ganha o apoio federal e, sem oposição, vence as eleições. Ferreira Chaves entrega a chefia do partido.
Definitivamente, o processo de deslocamento da hegemonia da oligarquia açucareiro-têxtil para a oligarquia algodoeiro-pecuária, foi premiado pelo afastamento de Chaves e pela ascensão de José Augusto / Lamartine. Sem atravessador, a oligarquia algodoeiro-pecuária exercia o poder representado por homens habituados à produção e ao comércio do algodão, e à discussão de suas estratégias técnicas.
Do açúcar para o algodão: a mudança do eixo econômico favorece o interior do Estado
A cana-de-açúcar era cultivada em torno "plantation" e o algodão dividido em pequenas e isoladas culturas. A economia açucareira no RN começa a enfrentar a crise, uma vez que o açúcar vai perdendo seu valor no mercado internacional, determinada pela concorrência nos mercados externos, carência de mão-de-obra, atraso tecnológico, etc.
Com a insignificância do açúcar nordestino no mercado externo, ocorre o crescimento do algodão e também a penetração do capital industrial na economia do Estado, desenvolvendo a diversificação de atividades e o crescimento urbano. Esse processo pode ser caracterizado pela exportação de capitais e integração ao sistema econômico internacional do capitalismo e à divisão intranacional do trabalho. Inclusive, em 1910, o governador Alberto Maranhão iniciou com banqueiros franceses uma operação de empréstimo externo para a modernização da capital.
A Primeira Guerra Mundial estabeleceu a hegemonia da cotonicultura na economia estadual, favorecendo o aumento das rendas públicas, procedendo do fortalecimento da máquina regional do Estado, com a profunda reorientação da política econômica do governo estadual para o algodão-pecuária (no Seridó).
No mundo político surgem os efeitos dessa mudança em 1914: Ferreira Chaves, apoiado por políticos seridoenses, rompe com os Maranhão e consegue ser o primeiro político republicano eleito governador fora do esquema daquela oligarquia.
No entanto, quando Ferreira Chaves tenta posteriormente se candidatar novamente (1923), José Augusto e Juvenal Lamartine reagem com apoio dos coronéis seridoenses. Com a intervenção de líderes do governo no senado e na Câmara Federal, José Augusto ganha o apoio federal e, sem oposição, vence as eleições. Ferreira Chaves entrega a chefia do partido.
Definitivamente, o processo de deslocamento da hegemonia da oligarquia açucareiro-têxtil para a oligarquia algodoeiro-pecuária, foi premiado pelo afastamento de Chaves e pela ascensão de José Augusto / Lamartine. Sem atravessador, a oligarquia algodoeiro-pecuária exercia o poder representado por homens habituados à produção e ao comércio do algodão, e à discussão de suas estratégias técnicas.
Da oligarquia Maranhão à política do Seridó
A Formação do Estado Republicano e a ascensão dos Maranhão ao poder
A Proclamação da República em 1889 traz o fim da monarquia, dando às classes dominantes locais um maior dinamismo político. Mas o primeiro presidente, Deodoro da Fonseca, luta por um governo centralizador, com poderes plenos. Em 1894, com Prudente de Morais, o grupo da descentralização chega ao poder, consolidando-se nas eleições seguintes. (ver A Instauração da República no RN: Centralização x Descentralização)
A descentralização contribuiu para o surgimento das primeiras oligarquias republicanas, onde grandes Estados se unem para comandar o país, e nos pequenos acontece a união entre os coronéis locais para os comandos estaduais.
Até a implantação da República não existia o Partido Republicano no RN, apenas focos isolados, destacando Caicó, onde Januário da Nóbrega, acadêmico de Direito em PE e filho seridoense, tentava, sem sucesso, a implantação do partido, desde 1886. (ver O Movimento Republicano no Rio Grande do Norte - Pioneirismo Seridoense).
O Partido Republicano só foi oficialmente fundado no RN no início de 1889, em Natal, com Pedro Velho, que ainda criou o jornal "A República", para divulgação partidária.
Como o Partido Republicano assume o poder nacional, Pedro Velho é
escolhido Governador do Estado. Mas, contrariando seus aliados logo ao escolher seu secretariado, Pedro Velho não convida aliados republicanos (deste partido chama apenas alguns familiares seus). A base de seu governo seria de políticos tradicionais, grandes latifundiários do agreste e os coronéis do Seridó.
Na política federal, Pedro Velho se associa ao PRP paulista, grupo representante da descentralização, o que justifica a sua deposição por Deodoro, este representante do centralismo.
Mas, com a renúncia de Deodoro e a ascensão de Floriano, Pedro Velho é reconduzido ao governo do RN. No governo seguinte, o de Campos Sales, define-se a política de descentralização, contribuindo assim para o predomínio da família Maranhão no governo do Estado, até 1914.
O declínio da oligarquia Maranhão e a ascensão do "Sistema" Político do Seridó
Com o objetivo de se manter no poder, em 1914, os Maranhão buscam lançar ao governo alguém de sua confiança da família, pretendendo voltar ao poder nas eleições seguintes. Os nomes apontados são contestados pelos coronéis do Seridó que, por sua vez, querem apontar outro nome.
Por outro lado, José da Penha, que era potiguar de nascença e deputado pelo Ceará, indica Leônidas Hermes da Fonseca ao governo do Estado, o que não é aceito pela oligarquia do Estado e é, inclusive, contestado pelo Presidente da República Hermes da Fonseca, que era o pai de Leônidas.
Joaquim Ferreira Chaves é o nome indicado pelo Seridó. Os Maranhão recorrem ao Rio de Janeiro para consultar a cúpula federal; esta, no entanto, apóia o nome de Chaves. José da Penha denuncia fraudes no governo do Estado mas, os correligionários de Chaves, José Augusto e Juvenal Lamartine, reorganizam o sistema no Seridó, impedindo que José da Penha se articule no RN. Este é obrigado a sair do Estado, pois corre risco de vida
Chaves é eleito governador do RN, rompe posteriormente com os Maranhão, tirando-lhes o monopólio do sal e da carne verde. A reforma da constituição enfraquece mais ainda os Maranhão, impedindo candidaturas de parentes até o 3º grau, criando também a vice-governadoria - que era representada pelo presidente do legislativo - e reduzindo o mandato do governador para quatro anos.
Chaves torna-se o novo chefe político do RN. A ascensão de Chaves demonstra que o poder político do RN, pautado no complexo açucareiror/têxtil, começa a despencar. Ocorre que o Seridó começa a tecer sua hegemonia baseada no algodão/pecuária, hegemonia esta que contribuiu para o aumento e diversificação das atividades econômicas de exportação. A 1ª Guerra Mundial contribuiu para o preeminência da cotonicultura, fortalecendo a máquina arrecadadora do Estado.
Em 1919, Chaves rompe com Tavares de Lira e Alberto Maranhão, devido o nome de Paulo Maranhão não compor a chapa de deputados do RN. Chaves impõe um nome para lhes suceder. Os Maranhão apresentam outro nome, mas são derrotados por Antônio de Souza, candidato de Chaves.
Em 1923, a convenção do PRF aponta Chaves como candidato a governador do RN o que não é aceito pelos coronéis do Seridó. Nesse processo intervêm o Catete que reconhecesse as lideranças de José Augusto e Juvenal Lamartine. Assim, seguros do suporte político conseguido, lançam José Augusto ao governo, que vence as eleições.
A ascensão José Augusto/Lamartine coroa a oligarquia algodoeira/pecuária. Mesmo tendo Chaves contribuindo para o desenvolvimento do Seridó, a oligarquia algodoeira passa a valorizar os intelectuais da região tornando o Seridó uma região forte e respeitada na política do nosso Estado.
Antecedentes da Revolução de 30 no RN
A Revolução de 1930 ocorreu num período em que o Brasil passava por mudanças políticas, sociais e econômicas decisivas para a história contemporânea do país. Tais mudanças se processavam com maior rapidez nos anos 20 e 30, quando se colocaram em questão as forças do poder da classe dominante, que se utilizavam de mecanismos antidemocráticos para se manter no poder: o voto não era secreto, atas eleitorais eram, via de regra, falsificadas, existia a proibição do voto às mulheres e analfabetos etc.
O desenvolvimento do país possibilitou o surgimento de novas atividades econômicas e, conseqüentemente, a consolidação de regiões não diretamente ligadas ao café. Surgem novas forças sociais: a burguesia industrial, que aliou-se aos grupos dominantes tradicionais, interessada em conter os movimentos operários; uma pequena burguesia atenta aos seus direitos; e um movimento operário organizado, que utilizava a greve como instrumento de defesa. O surgimento dessas novas forças sociais evidenciou a inadequação da então forma de domínio político para o desenvolvimento do país.
A pressão por mudanças na ordem política e sócio-econômica partia de vários grupos: dissidentes dos partidos das classes dominantes, operariado, completando-se com o movimento tenentista que agia no sentido de desalojar do poder a tradicional elite política. A oposição ao governo federal reuniu-se na Aliança Liberal.
As formas de poder da classe dominante gerava uma insatisfação popular que se estendia aos governos dos Estados. No Rio Grande do Norte, ocorria a oposição entre a "política do Agreste" e a do "Seridó". Os coronéis do
Seridó haviam apoiado a reação contra a oligarquia dos Maranhão e, mais tarde, apoiado a ascensão de José Augusto e de Juvenal Lamartine, que governava o RN na época da Revolução. Entretanto, os conflitos entre as facções da classe dominante acabavam em "arranjos entre vencidos e vencedores", enquanto que os conflitos entre os grupos no poder e a oposição (aliadas às classes populares) acabavam em repressão.
Em 1930, o governo de Juvenal Lamartine tinha fechado os sindicatos operários e a imprensa da oposição havia sido proibida, enfim, o governo havia silenciado a oposição. Em meio a um clima de instabilidade econômica surge a questão da sucessão estadual. O nome cotado pela oposição era o desembargador Silvino Bezerra Neto, que rompera com Juvenal Lamartine, em 1929, durante a campanha presidencial. No entanto, a campanha é interrompida quando a 03/10/1930, a Revolução explode no Rio Grande do Norte.
Com a Revolução os governantes estaduais são depostos pelos "tenentes". No RN começa uma disputa pelo poder onde a Aliança Liberal do Estado fica dividida em torno dos nomes Café Filho e de Silvino Bezerra Neto para o governo. Para resolver a questão é instituída uma Junta Governativa Militar que garantiu a ordem pública e consolidou a mudança de poder. Sendo, por fim, escolhido para presidente provisório do Estado o Dr. Lindolfo Câmara.
Mas, como o mesmo estava ausente, foi substituído interinamente pelo Dr. Irineu Joffily que cuidou de reformar os costumes políticos, apurando e instaurando inquéritos de atos políticos ocorridos na Velha República, além de tentar reduzir as despesas e o corpo de funcionários.
Joffily fundou também a Legião Revolucionária que tinha como objetivo garantir as instituições e restaurar os princípios republicanos".
A Revolução em curso: a conjunção de forças
Em 03 de outubro de 1930, estoura a revolução no Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Paraíba e Pernambuco. No Nordeste os tenentes Juarez Távora, Juracy Magalhães e Jurandy Mamede mobilizam os batalhões e promovem as deposições dos governadores estaduais. A população apóia e adere ao movimento, mas não tem uma participação decisiva e organizada.
Em 05 de outubro, o 29º Batalhão de Caçadores – batalhão do exército sediado na capital do RN, mas no momento destacado no interior da Paraíba - entra em Natal e depõe o governador Juvenal Lamartine, sem nenhuma resistência. No interior, os "coronéis" Dinarte Mariz – que participara desde o primeiro momento da fase "paraibana" da conspiração - pelo Seridó e Joaquim Saldanha, da região Apodi, aderem ao levante, mobilizando homens e armas.
O desgaste político dos governantes da República Velha impede o apoio popular para uma possível resistência. Enquanto isso, no Estado, a Aliança Liberal se divide quanto à questão do poder: de um lado os cafeístas desejam empossar seu líder Café Filho na presidência provisória, enquanto os liberais da aliança apontavam o nome do desembargador Silvino Bezerra Neto, com o apoio dos oficiais que comandavam o levante.
O impasse foi momentaneamente contornado com a instituição de uma junta militar que aguardava a chegada de Juarez Távora para definir a situação. Enquanto aguardava, a junta preocupou-se em consolidar a mudança de poder, remanejando o aparelho regional do Estado e garantindo a ordem pública. Nesse sentido, fechou a Assembléia Legislativa e as câmaras municipais, nomeou novos diretores de serviço, extinguiu mandatos
de prefeitos e intendentes, indicando outros titulares para os cargos. Afastou também oficiais do Regimento policial, substituindo por outros de sua confiança, enviou circulares às prefeituras do interior, recomendando garantia à vida e à propriedade dos adversários políticos.
Dinarte Mariz supervisionou a implantação dessa nova ordem na região do Seridó, ganhando respeito e gratidão das chefias ligadas à Revolução. Enquanto isso, na capital, a chefia de polícia distribuiu víveres entre os estivadores e as camadas pobres. A junta fez nomeações das diversas correntes da Aliança Liberal, o próprio Café Filho, da corrente Cafeísta, do Liberal Juarez Távora.
Em 12 de outubro de 1930, chega a Natal Juarez Távora acompanhado de José Américo e Irineu Joffily. Indicam Silvino Bezerra – irmão de José Augusto, mas dissidente das lideranças seridoenses - para a presidência. Entretanto, esse recusa, alegando parentesco com José Augusto e Juvenal Lamartine. Com esta recusa, é indicado João Lindolfo Câmara. Por este ver-se impossibilitado de chegar imediatamente, foi escolhido Irineu Joffily para exercer interinamente o cargo, com o apoio da corrente cafeísta.
Joffily acreditava que deveriam exercer cargos pessoas alheia às facções políticas locais, alguém "estrangeiro", pois esta seria a condição necessária para as diretrizes centralizadoras do governo republicano. Com o tempo, acrescentaria uma outra condição: que o escolhido fosse um militar recrutado entre o quadro tenentista, com isso garantiria neutralidade política do interventor.
O trabalho revolucionário começava conturbado. As razões passavam pelos vícios da política oligárquica e seriam difíceis de ser removidos.
As Interventorias de Irineu Joffily e Aluísio Moura
Joffily, não atendendo aos desejos políticos e clientelistas das chefias locais e praticando uma diretriz política de austeridade e racionalidade em sua ação governamental, conseguiu arregimentar contra si uma forte oposição. Viraram-se contra ele os políticos liberais pró-revolução, e as chefias tradicionais.
O Interventor estaria praticamente só. No início, contava com o apoio de Café Filho, que mobilizava as camadas populares, porém este terminou por dispensar tal apoio.
Com relação à ocupação dos cargos políticos, a política de Joffily encontrou forte reação, pois este nomeou paraibanos para a prefeitura de cidades potiguares, como também para o seu Secretariado. Um exemplo disso foi a substituição do Secretário Geral, Nestor Lima, pelo paraibano Jorge Peregrino, e assim se sucedeu com todo cargo que vagasse.
Toda essa situação despertou um forte sentimento regionalista, transformando-se em um argumento para a oposição. O orçamento de 1931 foi mais um setor de litígio, visto a inclusão de dois novos pontos em relação ao de 1930: aumento de impostos e a concentração do comércio de exportação e importação para Natal e algumas cidades do interior.
A reação mais uma vez foi forte, contudo, o interventor utilizou de alguns instrumentos excepcionais que a "situação revolucionária" lhe permitia: como baixar decretos, demitir funcionários públicos, influenciar transferências de militares, etc.
Entretanto, a oposição crescia e pedia o afastamento de Joffily, chegando a repercussão até a Capital Federal, onde a Imprensa o acusava de arbitrário e nepotista. O Governo Federal resistiu às pressões e insistia em mantê-lo no cargo.O caso M. F. do Monte e a queda de Joffily. O motivo que afastou Irineu Joffily da interventoria potiguar, esteve ligado à luta judicial envolvendo a interventoria e a firma M.F.Monte.
A firma M.F. Monte dedicava-se à compra e venda de algodão, e mantinha um estreito relacionamento com os coronéis sertanejos. Ao assumir a interventoria Joffily tomou conhecimento de um processo existente contra a firma, do tempo do governo Lamartine, na qual ela era condenada pela Recebedoria de Renda Estadual ao pagamento de 2.400 contos, por sonegação e multa. Na época, a empresa recorreu ao Governador Lamartine, que determinou a prescrição da dívida.
Joffily anulou o Decreto de Lamartine e iniciou a execução fiscal, baixando um Decreto vedando o judiciário de apreciar os atos do Poder Executivo Revolucionário.
Só restou à empresa recorrer ao Governo Federal, constituindo seu advogado o Dr. João Neves da Fontoura, importante prócer da Aliança Liberal, e influente nos negócios da Nova República. O recurso obteve êxito, tendo o despacho favorável do Ministro da Justiça, Osvaldo Aranha, e do Presidente Vargas.
Joffily imediatamente comunicou a Juarez Távora, Delegado Federal do Norte, sua renúncia. Távora mostrou a Aranha que discordava de seu despacho, mas este foi mantido.
A renúncia de Joffily deu nova dinâmica ao jogo político no Estado; as articulações para indicar o substituto se fizeram rapidamente.
A preocupação do Delegado Federal do Norte era que não fosse indicado um Interventor ligado aos políticos locais. Para isso foi indicado provisoriamente , o Tenente Aluízio Moura, colaborador do Interventor, como Comandante da Polícia Militar do Estado.
A Interventoria de Aluízio Moura
Aluízio Moura assumiu interinamente a interventoria potiguar, em 28 de janeiro de 1931, e a 3 de março do mesmo ano, foi oficializado como interventor.
No início de sua administração, Moura conseguiu o apoio de várias correntes da política local, mesmo algumas que apresentavam contradições entre si, à exceção da facção dos "Carcomidos", grupo ligado a José Augusto, que fez oposição ao interventor. A composição política do governo Moura privilegiou a ala cafeísta e o setor vinculado aos revolucionários militares como Pedro Dias Guimarães, na Prefeitura da capital, e o tenente Ernesto Geisel, como Secretário Geral e Chefe de Polícia.
No plano nacional , uma ala do movimento tenentista não se sentia contemplada no sentido de ver avançar reformas sociais e econômicas. Mesmo assim, Vargas continuava prestigiado por todos os setores da Revolução. Porém, os militares revolucionários temerosos que políticos ligados ao governo impedissem as reformas por eles pretendidas, decidiram reforçar suas posições no " Norte", sendo criada a Delegacia Federal do Norte, que isolada da influência direta do Catete, garantiria a marcha das reformas.
Moura inicialmente foi fiel às idéias da Revolução, nomeando uma comissão de sindicância , para apurar os atos das administrações anteriores, também procurou o interventor aproximar-se dos setores populares.
O principal caso político desse período foi a prisão de Café Filho e alguns revolucionários, sob a acusação de conspirar contra o governo do Estado. O Tenente Geisel apurou as denúncias sumariamente e julgou improcedente , exigindo do governo, reparação oficial. Este fato selou a sorte do intendente, pois se estreitou o relacionamento entre os cafeístas e os tenentes Geisel e Cordeiro, enquanto Moura cedia cada vez mais às pressões vinculadas ao antigo regime.
O clima no Estado ficou tenso e chegou ao ponto de Geisel, Cordeiro e alguns cafeístas pedirem demissão, fazendo críticas contundentes ao interventor. Em seguida Moura derruba todos os cafeístas e revolucionários
que ocupavam cargos de confiança e, mostrando sua ligação com representantes do antigo regime, Moura nomeia para o Secretariado pessoas ligadas às administrações anteriores.A polarização então se deu. Apoiaram Moura os chefes políticos ligados ao Partido Republicano, parcela de anticafeístas, militantes aliancistas liberais e prefeitos do interior.
Porém, o advogado Bruno Pereira e o Jornalista Fontes Galvão, elementos de peso da corrente liberal, divergiram de seu grupo e denunciaram o abandono da orientação revolucionária por parte de Moura. Contudo, opuseram-se à indicação de um interventor "estrangeiro".
Para permanecer no poder , Moura usou o peso da máquina estadual e também contou com o forte apoio das Associações Comerciais e Autoridades Municipais.
Mas Juarez Távora e Aranha mostraram a Vargas a necessidade de substituir o interventor, que restaurou a máquina política derrotada pelo movimento de outubro. Diante das pressões de várias correntes da política potiguar, Vargas indica Hercolino Cascudo para interventor, um nome desvinculado das facções políticas locais.
A rearticulação oligárquica pós 30
Os cafeístas no Poder
Com as dificuldades crescentes para enfrentar os constitucionalistas, Vargas nomeia Bertino Dutra interventor no RN (1932-33). Dutra marca seu governo pela ruptura com a passividade e prestigia os cafeístas. Nomeia Café Filho para Chefia de Polícia e entrega a principal prefeitura do interior aos cafeístas, como também a Imprensa Oficial.
Os liberais abandonam os revolucionários e vão unir-se aos derrotados em 1930, que terão como líder José Augusto e terão como projeto político a deposição de Dutra.
O interventor, apoiado no aparato do Estado, passa a combater os adversários com a repressão, censura e a sindicalização oficial, uma forma de manipular as massas populares para dar sustentação ao governo.
A aliança tenentismo/cafeísmo no RN no governo Dutra faz uso da legislação trabalhista tentando legitimar-se; também adota medidas preventivas quanto ao consumo e decreta o cerco dos campos para criação de gado, indo de encontro aos latifundiários.
Constituintes à vista
Apesar de derrotado, o movimento constitucionalista paulista ainda permanecia com os mesmo ideais, tanto em Minas quanto em São Paulo, e também em outros Estados. Assim, Getúlio Vargas percebeu que a convocação de uma constituinte era inevitável. Tal luta estava presente na
Revolução de 32, e por isso resolveu fazê-la , "segundo os seus interesses e de acordo com suas regras".
Além disso, vale dizer que Getúlio, apesar de ser "um político atento às mudanças econômicas e sociais do país" teve suas origens eminentemente nas oligarquias e, por isso, não pretendia ficar sob o jogo dos tenentistas que a cada dia ganhavam mais espaço dentro do governo. A constituinte serviria para desmontar esse empecilho do governo, pois seus membros teriam que disputar, pelo voto, os cargos parlamentares; e também para acabar com a insatisfação da alta patente do exército em ver os tenentes, cujo posto era hierarquicamente inferior, assumindo grandes poderes no governo.
Convocada a constituinte, começa o jogo das articulações políticas em torno das eleições parlamentares, com a fundação dos partidos no Estado. De um lado estava o grupo ligado a interventoria sob a liderança de Café Filho; do outro, estava José Augusto, Dinarte Mariz e outros partidários.
Após uma intensa movimentação pelo interior do Estado, recrutando lideranças municipais em apoio à chegada de José Augusto do RJ, em 12 de fevereiro de 1933, é fundado o Partido Popular do RN que aglutinava antigos membros do Partido Republicano (José Augusto) e revolucionários da Aliança Liberal (Mons. João da Mata Paiva), insatisfeitos com o prestígio dado a Café. "Segundo Dinarte Mariz, os partidários da interventoria haviam decidido não permitir a reunião de fundação do Partido Popular". A presença de um antigo colega de Dinarte na Revolução de 30, o delegado pernambucano Francisco Martins Veras, convidado a participar da fundação do partido por aquele, é quem acalma os ânimos, permitindo assim a reunião partidária.
Por outro lado, a situação estava organizada no Partido Social Nacionalista, fundado no 04 de abril de 1933 e que tinha a presença de José de Calazans e Café Filho, dentre outros. Este partido aglutinou para si lideranças municipais que faziam oposição aos antigos políticos do "velho regime", sindicatos e membros regionais do Clube 3 de outubro. Surge então uma nova facção política no Estado.
Após a Revolução de 1930, o tenentismo estava desarticulado devido, talvez, ao novo conceito político estabelecido por Vargas (convocação da Constituinte) e a obrigatoriedade do movimento ter que buscar junto ao povo, através de eleições, sua sustentação.
Ambos os partidos defendiam propostas sociais que recebiam o apoio da Igreja , especialmente no que diz respeito ao sindicalismo livre, este, por sinal, era uma forma da Igreja ingressar no movimento operário.
A campanha eleitoral para Assembléia Nacional Constitucional
O RN teria direito a quatro vagas. Com isto o Partido Popular (PP) e o Partido Social Nacionalista (PSN) realizam convenções e apontam seus candidatos. Dos quatro candidatos do PP, dois haviam sido revolucionários em 30: Dr. Francisco Martins Veras e o Capitão Júlio Perouse Pontes. Perouse fez parte da Junta Militar que ocupou o poder após a queda de Lamartine. Os quatro candidatos do PSN eram ligados familiarmente a Juvino Barreto, Pedro Velho, assim como politicamente a Café Filho e Getúlio Vargas.
A campanha realiza-se cheia de acusações, sendo o Jornal "A Razão" ligado ao PP censurado e fechado oito dias antes da campanha. Comerciantes de Natal e Mossoró protestam contra os impostos cobrados baseados no sistema paraibano, o que se torna em tema de campanha para o PP. José Augusto denuncia o PSN junto ao Ministro da Justiça e Aviação, que dificultava a ação política do PP no Estado. O clima é favorável à campanha do PP, que se baseia numa temática ligada à família, defesa da propriedade e do casamento indissolúvel da religião católica. O PSN tenta seguir o mesmo caminho, mas as lideranças católicas mesmo tendo representantes dentro do PSN, apóiam o PP e acusam o PSN de socialista, comunista e divorcista, o que facilitou ainda mais a vitória do PP. O PSN acusa a Legião Eleitoral Católica (LEC) de apoiar os maçons, que eram ligados ao PP. O Clube 3 de Outubro e o Correio do Povo saem em defesa do PSN, que busca apoio junto ao Cardeal Leme, esse é defensor de candidatos de qualidades intelectuais e morais, facilitando assim o apoio dos católicos do PP, que elege três dos quatro candidatos, contra um do PSN.
Oitenta e oito por cento dos eleitores aptos a votarem vão às urnas, totalizando 16.907 votantes. O PP obteve 9.244 votos de legenda contra 7.078 do PSN. Duas urnas são anuladas, uma de Caicó e outra de Santana do Matos, sendo realizadas novas eleições nesses municípios, sem que houvesse modificações significativas. O 29º Batalhão de Caçadores é substituído pelo 21º. Dutra pede demissão e, com a vitória do PP, os grupos políticos remanescentes mostram novamente suas forças.
As violentas eleições de 14 de outubro de 1934
Aos 14 de outubro de 1934, o RN contava com cerca de 47.702 eleitores alistados para escolherem, através do voto direto, os cinco representantes da Câmara Federal e os vinte e cinco representantes da Câmara Estadual, enquanto que o governador e os senadores seriam escolhidos pelas assembléias.
Concorreram às eleições o Partido Popular, tendo como cabeça de chapa Rafael Fernandes, que na época recebera críticas, através da imprensa estadual, de ser um político arbitrário e personalista. O partido era julgado como representantes da burguesia, pois apresentava uma postura tradicional com visão ruralista.
Do outro lado, estava a Aliança Social (AS), formada pelo Partido Social Democrático (PSD) e pelo Partido Social Nacionalista (PSN). A aliança tinha Mário Câmara como candidato a governador e os demais componentes de chapa estava divididos entre os dois partidos. Empregavam um discurso populista e anti-oligárquico, diziam-se atentos aos interesses das massas e, portanto, verdadeiros representantes do povo.
Além da Aliança Social e do Partido Popular, outras duas organizações partidárias concorreram ao pleito, apesar de não conseguirem êxito na política potiguar. Tratava-se do Partido União Operária Camponesa do Brasil, com representantes do PCB e a Ação Integralista Brasileira (AIB), no qual estava um grande nome da história do RN, o historiador Câmara Cascudo.
As eleições de 1934 foram de grande repercussão. As violências sofridas pelos eleitores, principalmente aqueles que estavam ligados ao Partido Popular, não foram poucas. Mário Câmara queria ganhar as eleições a qualquer custo e a utilização de seus métodos eram comuns naquela época. Mas não podemos nos esquecer de que os populistas também não ficavam por baixo, ou seja, não aceitavam as violências passivamente, já que tinham o apoio de grande parte do Exército e também dos coronéis e seus jagunços. Durante as eleições veio para o Rio Grande do Norte o observador Neiva Júnior que ouviu falar da agitação das mesmas no Seridó. Mas a avaliação que ele fez das eleições não foram em nada parecidas com o que houve realmente e, com isso, ele desagradou aos dois partidos, o partido de Mário Câmara (Aliança Social) achou que o "Observador" havia sido manipulado pelos populistas e o Partido Popular considerou que o mesmo foi passivo às pressões policiais da interventoria.
Devido às violências ocorridas no pleito de 1934, o TRE convocou eleições suplementares em 39 seções de 23 municípios, no período de 3 a 28 de fevereiro de 1935. Durante o período das eleições suplementares explodiu em Natal uma greve de uma companhia estrangeira que monopolizava os serviços de bondes, água, luz, etc. A cidade ficou praticamente paralisada, sem esses serviços, sem contar que várias outras categorias também aderiram à greve. Os operários tomaram conta das instalações da empresa, que estava sendo vigiada pela Guarda Civil que, no entanto, não desalojou os grevistas. Uma comissão é constituída para negociar um acordo com a comissão de operários. A situação agravou-se quando o comando da 7ª Região Militar determinou ao comando do 21° Batalhão dos Caçadores que pusessem fim à paralisação. Após uma semana de greve, a repressão ao movimento fez com que os grevistas suspendessem a paralisação, após algumas concessões da empresa.
Outro acontecimento que chamou atenção nesta mesma época foi o assassinato do engenheiro Octávio Lamartine, filho do ex-governador Juvenal Lamartine. Ele foi morto por um volante policial sob o comando de um tenente da Força Pública. A oposição responsabilizou Mário Câmara.
As eleições desse período foram concluídas em 2 de abril de 1935, dando uma vitória da Aliança Social sobre o Partido Popular. A imprensa paulista, simpática ao Partido Popular, acusou Mário Câmara de ter alterado a composição do Tribunal Eleitoral para atender a seus interesses políticos. O jornal A República tentou abrandar as acusações publicando que as alterações introduzidas na composição do Tribunal resultavam de novas orientações previstas na legislação federal.
A apuração final, em outubro de 1935, daria a vitória ao Partido Popular que elegeria três representantes para a Câmara Federal e uma maioria de cadeiras na Assembléia Constituinte Estadual. Com esta maioria, o Partido Popular elegeria o governador e os senadores federais ligados ao seu partido.
O início de 1935 foi marcado pelo fechamento político que liquidou paulatinamente a liberação iniciada com a eleição para a Assembléia Nacional Constituinte. As eleições anteriores confirmaram a maioria das facções fiéis à Vargas, porém em outras partes do Brasil, as apurações se arrastavam por mais alguns meses, criando dificuldades para que Vargas impusesse seus interesses. Apesar de Armando Sales ter se aliado a Vargas, Flores da Cunha representava uma ameaça, pois sua interferência irritava e incomodava o atual presidente, impedindo que o mesmo impusesse disciplina hierárquica necessária à dominação do Estado sobre a sociedade civil, já que nos quartéis os militares estavam envolvidos com outras facções políticas.
Entre 1934-35, a classe operária e a classe média se uniram e organizaram uma frente popular forte (ANL), com tendências a combater as classes dominantes. No RN, a luta entre as duas facções se prolongava, havia assim divergências entre as forças do Exército e o interventor Mário Câmara, chegando a haver conflito com morte. O próprio Mário Câmara foi ameaçado. Vargas logo socorreu o interventor mandando reforços militares com ordem de expulsar da capital todos os indivíduos de fora, desordeiros ou perigosos para tranqüilizar a população. Mediante estes conflitos, vários deputados sentiram necessidade de adotar uma política contrária ao governo Vargas.
O Tribunal Superior Eleitoral continuava julgando os recursos referentes às eleições potiguares que, em geral, favoreciam o Partido Popular. Somente em 26 de julho é que foi publicado o resultado final, com a vitória do PP. Logo após, iniciavam-se as greves que reivindicavam aumentos salariais. Estes conflitos chamaram a atenção do governo federal, que mandou reforços para o interventor interino.
No período de 1935, o interventor Mário Câmara tentou solucionar um problema estadual que era, de resto, de todo Brasil: o alto preço do sal. Com isso, surgiu um movimento do comércio importador do Sul do país, exigindo do governo que liberasse a tarifa para a entrada do sal estrangeiro. Nessa estadia na capital, Mário Câmara tenta articular para reverter em seu
favor os resultados das urnas. No entanto, o destino político do RN já se encontrava determinado pelas alianças bem sucedidas das oligarquias potiguares e governo central. A vitória era do Partido Popular.
Novamente as forças do "antigo regime" se rearticulavam e conseguiam espaço no governo de Vargas. Somente uma breve, mas temerosa turbulência as acometeriam: o levante comunista de 1935.
Organização Sindical no RN após a Revolução de 1930
Café Filho, perseguido pelos oligarcas da República Velha, militava no movimento sindical do Estado. Mas por perseguição do governo Juvenal Lamartine, tem que se refugiar no vizinho Estado da Paraíba.
Articulador da Revolução de 30 na Paraíba, na volta ao RN como a Revolução vitoriosa cria grande expectativa junto ao operariado, vez que, conforme se presumia, Café Filho iria dar amplo apoio àquela classe. Até mesmo o PCB mostrava-se confiante na volta do antigo líder da classe sindical do Estado.
Porém, as coisas começam a modificar-se. Café, perseguido implacavelmente pelos conservadores oligárquicos do governo anterior, passa de "caça ao caçador". Apoiado no Decreto Federal n.º 19.770, que controlava a criação e funcionamento dos sindicatos (era preciso uma espécie de autorização para o seu funcionamento), Café Filho, real representante dos ideais de controle dos trabalhadores varguistas, impede e nega, mesmo sendo diversas vezes requerido, autorização para que outras tendências sindicais - ligados ao PCB - consigam autorização para o funcionamento dos sindicatos que não recebessem orientação cafeísta e não comungassem com a política de Getúlio Vargas.
O sindicalismo norte-rio-grandense seria polarizado entre os que seguiam Café e os que apoiavam os comunistas. No entanto, somente os cafeístas adquiriram a "legalidade" para o funcionamento de seus sindicatos. Criam-se, portanto, os sindicatos independentes que funcionam basicamente na ilegalidade e que são escorados na União Geral do Trabalhadores, que dava suporte e que aglutinava os trabalhadores dos diversos ramos do Estado, com tendência comunista.
Neste sentido, Mossoró, cidade eminentemente comercial e salineira, e que absorvia uma mão-de-obra que oscilava ente 5 a 8 mil trabalhadores, é palco da mais alta organização sindical do Estado, onde os trabalhadores, seguindo a orientação do PCB ampliam essa organização por diversos municípios da região Oeste. O surgimento dos sindicatos de Mossoró e outras cidades próximas decorreu do próprio movimento comunista.
Portanto, o que podemos perceber é que a organização sindical que estivesse marginal ao decreto seria violentamente reprimida por Café Filho. Foi o caso do "Sindicato do Garrancho" - movimento sindical obrigado a reunir-se clandestinamente em lugares ermos, daí seu nome.
A perseguição aos sindicatos comunistas acentuou-se, ao ponto da organização começar a discutir o destino a ser seguido. Começam a aparecer rumores da existência de um movimento sob a liderança de PCB nacional, que pretendia, através da força, destituir o Presidente Vargas. Decide-se então, aqui na região de Mossoró, que o PCB, independentemente da orientação regional, desse início a um movimento guerrilheiro como ação preparatória ao movimento de insurreição nacional, que amadurecia. Era o início da guerrilha no vale do Açu. (Ver A Guerrilha do Açu).
A greve dos operários da estrada de ferro de Mossoró, que reivindicavam aumento de 100%, incita outras categorias, especialmente os salineiros de Mossoró e Macau, que também aderem ao movimento. Os empresários, temendo que o movimento considerado de caráter extremista ganhasse proporções maiores, atendem os pleitos apresentados.
Esse seria o primeiro ato do dramático Levante Comunista de 1935.
A Guerrilha do Açu

Em 1935 eclode na Várzea do Açu, sob a orientação do comunista Manoel Torquato, o movimento armado que logo chama a atenção das autoridades estaduais e do governo federal. O fato é amplamente divulgado pela imprensa do país.
Reprimido pela polícia, o movimento é desarticulado com a prisão dos principais mentores. No entanto, alguns dias depois, o grupo consegue fugir e reorganizar o movimento. Usando táticas de guerrilha, o grupo ensaiava a tomada do poder central pelo movimento comunista, sob a orientação de Carlos Prestes. O número de combatentes, apesar da ausência de dados oficiais, chegava a 80. Sobreviviam, com assaltos às fazendas, onde conseguiam dinheiro e animais, e promoviam a adesão dos trabalhadores à luta armada.
A guerrilha comunista, aprovada numa assembléia do Partido, no primeiro momento, objetivava criar uma situação defensiva ao surgimento do movimento insurreto nacional. O movimento sindical mossoroense, criado por inspiração do PCB, ganha, cada vez mais, adeptos e consistência na região, alarmando e criando insatisfação na população e nas autoridades.
Como naquela época o PCB consegue aglutinar um contigente tão relevante de trabalhadores à guerrilha? Um dos motivos apontados pela historiografia, mostra, primeiro razões incidentais como a ação do protestantismo na região.
Manoel Torquato, que fora protestante, era um homem experiente, moldado pelo trabalho de evangelização, sendo, assim, um exímio conhecedor da região. Nas suas andanças tinha conseguido o respeito e o apreço da
população. Além disso, a Várzea do Açu era uma região geograficamente favorável, próxima à Macau, Areia Branca (ambas portuárias) e Mossoró. Isso facilitava o fluxo de pessoas entre elas, principalmente porque esta última possuía um contigente considerável de trabalhadores.
Apesar de mostrar-se como um grupo coeso, a criação do movimento guerrilheiro comunista no Açu não recebia a orientação regional do PCB. Tanto é que quando a insurreição do 21º Batalhão de Caçadores acontece em Natal, no dia 23 de novembro de 1935, o grupo de Torquato não toma conhecimento de imediato, fazendo com que Mossoró, que até então possuía um grande e organizado movimento operário, pudesse se articular com aquele levante.
Após o fracasso de Natal, os comunistas são intensamente perseguidos e presos no Estado, inclusive os localizados na Várzea. Mesmo assim, os guerrilheiros da Várzea do Açu continuaram sua luta, famintos e isolados, até 1936, quando finalmente foi morto o líder comunista do Oeste, Manoel Torquato. Com a sua morte, termina enfim o movimento comunista, que causou reboliço em todo o Estado e até mesmo a inquietação do governo federal.
A insurreição comunista de 1935 em Natal

Na cidade de Natal, no dia 23 de novembro de 1935, o movimento comunista se faz presente através do levante do 21º BC, quando se antecipa à insurreição preparada por Carlos Prestes.
O Batalhão resiste pouco, poucos soldados guardavam-no e com a participação de oficiais do próprio batalhão, além de operários estivadores e civis, o quartel é facilmente dominado, sem resistência, "em nome do capitão Luís Carlos Prestes".
Gradativamente a onda revolucionária espalha-se pela cidade. O governador Rafael Fernandes, que no momento do ataque estava no Teatro Carlos Gomes, toma conhecimento do fato e refugia-se em casa de um amigo, igualmente ocorrendo com Gentil Ferreira, prefeito de Natal, que consegue refugiar-se no consulado chileno.
Todas as repartições públicas foram dominadas a partir daquele momento. Isso tudo foi precedido de muita correria, fugas, combates e muitos tiros. Sem poderem resistir, os leais ao governo constitucional são dominados e muitos deles presos, viabilizando assim a constituição da junta governativa, que se autodenomina de Comitê Popular Revolucionário. Como primeira medida, a junta apresenta um decreto destituindo o governador e a Assembléia Legislativa. É publicado também o jornal revolucionário "A Liberdade".
No calor dos combates surge, certamente como um herói artificialmente construído, a figura de Luiz Gonzaga. A morte deste, falecido "em combate" , é explorada pela propaganda do governo como forma, talvez, de criar no seio dos norte-rio-grandenses um símbolo de resistência ao comunismo.
Conforme notícias oficiais Luiz Gonzaga era um soldado leal ao governo e morrera defendendo a sua bandeira; outros, porém, baseados em depoimentos dos que participaram do movimento dizem que o mesmo era um simples mendigo surpreendido por uma bala perdida.
O governo comunista em Natal prossegue. Como forma de ampliar os seus domínios era preciso angariar recursos em dinheiro. Para isso foi determinado o arrombamento do Banco do Brasil em Natal donde se retiram importantes quantias, que posteriormente, pelo menos uma parte foi recuperada. Isso ocorreu também com o dinheiro da Fazenda Estadual.
Rumo ao interior, o movimento ampliou-se e conseguiu dominar 17 cidades das 47 existentes. Constituído por colunas o movimento comunista espalha-se pelo nosso território, promovendo a tomada das prefeituras, incêndio dos cartórios, soltura dos prisioneiros da cadeia e nomeação de um novo prefeito. Requisitam o dinheiro da prefeitura e da mesa de rendas, além de destituírem o delegado e o tabelião público.
Em direção ao Seridó, os rebeldes tomam Santa Cruz, única cidade do Estado que aclama e aplaude o movimento. A partir dali, o movimento dirige-se a Currais Novos. No entanto, encontram resistência, especificamente na Serra do Doutor, através de um grupo armado sob a liderança de Dinarte Mariz, que consegue desmontar os rebeldes, que saem em fuga.
Apesar de questionarmos a participação concreta de Dinarte Mariz no combate da Serra do Doutor, o que podemos perceber é que a região do Seridó, a partir de notícias acerca do que acontecia em Natal, organizou-se e conseguiu esfacelar o movimento comunista no Trairí, influenciando decisivamente a derrota dos rebeldes em nosso Estado.
Como vimos, apesar de ter deixado marcas profundas no seio do RN, numa perspectiva de proposta administrativa a partir da classe operária. O movimento comunista, a partir de Natal, não conseguiu obter êxito diante da falta de articulação entre as colunas do interior e, principalmente, tendo em vista as notícias vindas dos Estados vizinhos de que tropas policiais se dirigiam com destino ao nosso território. Todo o movimento no Estado durou apenas três dias.










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